‘Bons costumes’ nos condomínios

Preceitua o art. 1.336, inciso IV, do Código Civil, que é dever dos condôminos respeitar os bons costumes. Mas o que se considera ‘bons costumes’? Ou seja, o legislador colocou bons costumes como uma limitação de comportamento dentro dos condomínios.

Costume é hábito, rotina. Essas práticas, quando reiteradas, viram costume. Contudo, bons costumes, no sentido jurídico, não é o que é moralmente aceito pela sociedade.

A professora Thamis Dalsenter Viveiros de Castro ensina que ofensa a padrões sociais e costumes tradicionalmente observados em determinadas sociedades não são, por si só, reprováveis do ponto de vista jurídico. Não se pode limitar a conduta humana com base em valores de determinados grupos sociais se estes não encontram restrição constitucional1.

Na seara condominial, a diferença entre os bons costumes sociais e jurídicos é muito rica e deve ser analisada com cautela para evitar censuras legais equivocadas. Vejamos alguns exemplos.

Em um edifício comercial, uma garota de programa que atua com discrição e recebe seus clientes com identificação na portaria (sem comprometer a segurança), da mesma forma que faz um dentista, um advogado ou qualquer outro ocupante, por mais que possa atentar aos bons costumes sociais, não revela qualquer ilícito jurídico – não podendo ter sua atividade restrita com base nos bons costumes2.

Uma entidade religiosa, aceita socialmente, pode ser proibida de exercer suas atividades se seus seguidores resolverem fazer uma campanha de conversão com os demais moradores e empregados do edifício.

O condômino adimplente que impede o regular prosseguimento de uma assembleia por monopolizar a palavra ou promover debates inúteis e/ou intermináveis incorre em uso abusivo da palavra (art. 187 do Código Civil) e, portanto, fere os bons costumes, ainda que seja educado em suas colocações. Nesse sentido, só se pode interferir na liberdade de agir de alguém, com base nos bons costumes, quando o seu exercício atingir na esfera jurídica de outra pessoa – sejam moradores, empregados, terceirizados, entregadores, visitantes e demais –, não podendo conceitos morais restringirem direitos garantidos pela Constituição Federal.

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1 In Revista Brasileira de Direito Civil – RBDCivil | Belo Horizonte, vol. XIV, n. 4, pp. 99-125, out./dez. 2017.

2 Vale lembrar que a prostituição não é crime.

Luis Arechavala é advogado, sócio fundador do escritório Arechavala Advogados. Membro de diversas comissões da OAB/RJ e OAB Niterói/RJ, da Associação Brasileira de Advogados (ABA), do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM). Autor do livro ‘Condomínio Edilício e suas instituições’

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