O indispensável relacionamento da Gestão Condominial com o Conselho Tutelar
Atualmente, observamos um movimento contínuo direcionado à ocupação de condomínios para fins de moradia e residência, sejam eles de casas ou apartamentos.
Nesse contexto de mútua interação, não tardam ocorrer situações conflituosas, tais como como brigas e discussões envolvendo a população mais jovem, uso e tráfico de drogas nas dependências do condomínio, vandalismo generalizado, furtos e roubos, uso inadequado das redes sociais, dentre outras condutas antissociais praticadas pela população infanto juvenil, presente e constante à realidade de cada unidade condominial.
Por óbvio que, caso a conduta de algum morador infanto-juvenil venha a se subsumir a uma transgressão às normas condominiais de convivência, importa ao síndico aferir a gravidade da conduta e o contexto em que ela foi praticada, e eventualmente advertir e/ou multar os responsáveis legais daquelas mesmas crianças ou adolescentes, objetivando com isso prevenir a não ocorrência de tais comportamentos.
Contudo, caso a conduta praticada pela criança ou adolescente, além de ofensiva às normas condominiais, venha a adquirir contornos de maior gravidade, como é o caso do cometimento de crimes ou de contravenções dentro do perímetro condominial, além do exercício de seu poder disciplinar na esfera da gestão administrativa, deverá o síndico acionar as autoridades policiais, valendo-se, preferencialmente, de sua assessoria jurídica, apoio este considerado fundamental na gestão profissional contemporânea de condomínios. De acordo com o disposto no Art. 103 da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), os crimes e contravenções eventualmente praticados por crianças ou adolescentes devem ser denominados de “atos infracionais”.
Com tal providência, o síndico preserva sua integridade física e a de sua família, evita desnecessária exposição pessoal e previne possíveis represálias que possam decorrer como efeito conexo do ato de denúncia do comportamento às autoridades públicas. Mas a ação do síndico não deve se restringir a acionar a polícia, isso porque existe outro órgão público de grande importância que deve ser igualmente acionado e comunicado, vale dizer, o Conselho Tutelar.
Na atualidade, todos os Municípios do Brasil devem contar com ao menos um Conselho Tutelar, que por definição legal é “órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente” (conforme o Art. 131, da Lei 8.069/1990).
Assim é que deve o síndico possuir conhecimentos a respeito do papel do Conselho Tutelar, o qual se efetiva a partir da responsabilidade de cada um de seus integrantes, os denominados “conselheiros tutelares”; sendo que, de acordo com as diretrizes legais, o órgão deve possuir independência funcional e autonomia perante a Administração Pública municipal, até porque o Conselho Tutelar não integra os quadros administrativos públicos. O município deve priorizar o repasse de verbas destinadas ao Conselho Tutelar, conforme a redação do Art. 4º, parágrafo único, “d”, do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).
Ao receber o membro do Conselho Tutelar no condomínio, o funcionário condominial ou o agente terceirizado responsável pela triagem de acesso às áreas comuns deve saber de antemão que configura crime e infração administrativa causar qualquer tipo de embaraço à função desse servidor público, cujo exercício possui extremada importância, uma vez que se encontra associado à tutela dos direitos de crianças e de adolescentes.
Conhecendo o Conselho Tutelar, tendo ciência de sua composição e de suas funções precípuas, e especialmente, sabendo quando acioná-lo, o síndico passa a se conformar como um agente integrante da rede de proteção dos direitos fundamentais da população infanto-juvenil presente aos condomínios, contribuindo sobremaneira para a concretização da tutela dessa particular população, enobrecendo sensivelmente o cargo que exerce, não se restringindo ao papel de um simples gestor, mas adicionando a esta sua posição, a de conciliador e a de difusor da cultura da paz, papéis relevantes e imprescindíveis para o enfrentamento dos desafios peculiares dos tempos atuais.
Vander Andrade
Advogado, mestre e doutor em Direito, pós-graduado em Direito Imobiliário, vice-presidente da J. Reuben Clark Law Society e presidente da Associação Nacional de Síndicos e Gestores Condominiais