Maus-tratos contra animais em condomínios: como agir?
A Revista dos Condomínios, por intermédio de seu repórter, foi ouvir a especialista, a advogada Giovana Poker, sobre os maus-tratos aos animais. Prática intencional ou negligência, a lei reserva aos seus autores penalidades e multa.
Como configurar os maus-tratos
De acordo com Poker, os maus-tratos aos animais são configurados, sempre que for praticado algum tipo de negligência ou violência de ordem: física ou psicológica contra um animal de qualquer espécie. É claro que a violência de ordem psicológica tem maior dificuldade de ser comprovada. Nesses casos, o testemunho é essencial. Quem são autores mais comuns da violência? Os animais podem ser vítimas de maus-tratos por parte do próprio tutor ou de terceiros. Tal conduta é classifi cada como crime ambiental. Como explica Poker, nos termos da lei (art. 32 da Lei 9.605/98), praticar ato de abuso, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, é punível com penalidade de três meses a um ano – além da multa.
Cães e gatos
Já nos casos em que o crime é praticado contra cães e gatos, “a penalidade será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda, sendo a penalidade majorada em virtude da Lei Sansão, de 2020” – ressalta a advogada. Segundo Poker é importante observar que não é necessário que haja de fato uma agressão para que o crime de maus-tratos seja configurado. Qualquer atitude que resulte em um sofrimento desnecessário para o animal pode ensejar a responsabilização criminal do infrator. Ela ofereceu alguns bons exemplos objetivos para caracterizar esses maus-tratos: privação de alimentação ou água; submissão do animal a medo ou stress; e restrição de espaço e/ou isolamento social do animal são situações que violam o bem-estar animal e, portanto, são passíveis de punição.
Teoria do Link
Infelizmente, os maus-tratos a animais são frequentes em nossa sociedade, sendo imprescindível uma maior atenção para o assunto. A preocupação apresentada pela especialista é respaldada por estudos científicos. Eles comprovam que pessoas que são violentas com animais também são potenciais agressoras de outros seres humanos.
Violência como comportamento
De acordo com a advogada essa premissa é a chamada Teoria do Link. Por isso, não é incomum que “durante a investigação de casos de maus-tratos contra animais, seja identificado um contexto de violência doméstica cometida pelo mesmo responsável” – garante.
Pesquisa Ibope:
Violência animal Para comprovar suas afirmações a advogada apresenta como referência uma pesquisa realizada pelo Ibope, em 2019. Segundo ela, 92% dos entrevistados já presenciaram maus- -tratos a animais. Entre os principais atos, a pesquisa destacou animais passando fome (50%) ou sede (42%) e sendo agredidos (38%). Agora o dado mais impactante: somente 17% das pessoas disseram ter feito alguma denúncia – seja para o síndico ou para autoridades de segurança.
Pesquisa que serve de amostra para qualquer comunidade
E essa realidade não é diferente nos condomínios. Para evitar indisposição com os vizinhos, de acordo com a experiência de Poker, “muitos condôminos acabam deixando de tomar as devidas providências diante de situações que configuram maus-tratos ou indício de maus tratos” – sinaliza. Síndico: Denúncia obrigatória E é por isso que muitos municípios vêm impondo a obrigatoriedade da denúncia aos síndicos e administradores condominiais. No Rio de Janeiro, a “Lei Municipal (nº 7.053/2021) obriga os condomínios residenciais e comerciais, representados por seus síndicos ou administradores, a denunciarem a ocorrência de casos de maus- -tratos aos animais nas unidades autônomas ou nas áreas comuns condominiais, sob pena de multa de R$5.000,00, podendo chegar a R$10.000,00 em caso de reincidência no descumprimento” – registra a advogada.
Flagrante
Caso o síndico (ou morador) esteja diante de uma situação flagrante de maus-tratos, onde o animal está em situação de risco de morte iminente, ou submetido a dor intensa, a orientação é acionar imediatamente a emergência policial (190) – indica Poker.
Suspeita
Nos casos em que há suspeita do crime, ensina a especialista, é necessário uma melhor apuração. “Deve-se registrar o Boletim de Ocorrência na delegacia de polícia mais próxima ou na delegacia especializada em crimes contra animais” – adverte.
Responsabilização do condômino: Autor
E ainda, finalizando, ela garante que o morador que cometer qualquer ato de violência ou for negligente com seu animal, deixando o animal sozinho na unidade autônoma durante uma viagem, por exemplo, “também estará sujeito às sanções condominiais, podendo ser notificado e multado, além de responder pelo crime praticado”.
Outras leis, outras garantias, outros deveres
Giovana Poker lembra ainda, a Lei (nº 3153/2015) do município de Niterói (RJ). Segundo ela, a lei estabelece que os administradores de espaços coletivos, tais como condomínios, clubes, dentre outros, deverão zelar pela proteção dos animais, comunicando ao Centro de Controle de Zoonoses e à Secretaria de Meio Ambiente Recursos Hídricos e Sustentabilidade, “os casos de maus tratos, sinais de enfermidades e óbitos de animais comunitários nas áreas comuns do condomínio, sob pena de multa”.
Síndicos: É bom “abrir o olho”
Portanto, os síndicos e administradores são responsáveis por identificar os indícios de maus-tratos e apurar as reclamações em relação a atos de violência ou negligência que possam estar ocorrendo em relação aos animais de estimação dos próprios moradores e em relação aos animais comunitários, que eventualmente vivam nas áreas comuns. Poker alerta que “a denúncia aos órgãos responsáveis não é facultativa”.
Indícios: Sinais de maus-tratos
A especialista ensina que animais que latem ou choram excessivamente; e/ou mau-cheiro vindo da unidade autônoma, por exemplo, “são sinais de que o animal está com algum critério de bem-estar violado”. Outra situação bastante comum em condomínios, de acordo com a experiência da advogada nesses casos, é encontrar animais trancados nas sacadas, onde muitas vezes não há espaço sufi ciente para o animal, além da total exposição ao sol, vento, chuva, etc.
Foi assim que diversos cachorrinhos já vieram a óbito após serem deixados presos na sacada de prédios, exposto ao sol e calor. E é ela, Poker, quem fornece os links para as reportagens que serviram como exemplos mencionados nesta entrevista.
“5 Liberdades”
Identificando maus-tratos
Como identificar se um animal está em situação de maus tratos? Segundo Poker, é necessário observar se alguma das cinco (5) liberdades está sendo violada. Essas “5 Liberdades” dos animais são um conjunto de princípios estabelecidos para garantir o bem-estar dos animais domésticos e domesticados. São elas:
1. Liberdade de fome e sede: Isso significa a garantia de acesso fácil a água fresca e dieta alimentar adequada para manter a saúde e a vitalidade.
2. Liberdade de desconforto: Os animais devem ter um ambiente adequado, incluindo abrigo e uma área confortável para descansar.
3. Liberdade de dor, ferimentos e doenças: Isso implica a prevenção ou tratamento de doenças e lesões por meio de diagnóstico rápido e intervenção veterinária apropriada.
4. Liberdade para expressar comportamento natural: Os animais devem ter espaço sufi ciente, instalações adequadas e, em caso de animais gregários, precisam ter companhia de outros animais de sua espécie para expressar comportamentos naturais.
5. Liberdade de medo e angústia: Isso significa garantir condições que evitem o sofrimento mental dos animais, como a presença de estímulos que causem medo extremo ou estresse.
Giovana Poker Advogada animalista, mestra em Direito com foco em Dignidade Animal e fundadora do escritório de advocacia Giovana Poker – Direito Animal.