A profissão de síndico e o mercado condominial
À atividade de síndico profissional, embora de extrema relevância social e econômica, ainda não configura no rol das profissões regulamentadas, é pouco valorizada, além do que o mercado condominial, em sua grande parte, não percebe a devida importância do capital intelectual, da experiência profissional e da estrutura tecnológica colocada à sua disposição, priorizando, a forma artesanal e obsoleta de administrar condomínio. Deixa-se, assim, de reconhecer os valores agregados no diferencial de serviço, que é traduzido em bem-estar para os condôminos e valorização patrimonial, prevalecendo como critério na seleção do síndico apenas o menor preço como único diferencial a ser avaliado.
O processo de eleição do síndico se dá por meio de reuniões com pouca participação e poucos candidatos ao posto, nas quais uma das palavras mais temidas é “… quem quer ser o síndico”, seguida de um alívio geral quando um candidato aparece. Nesse diapasão os cuidados em salvaguardar vidas e bens patrimoniais, muitas vezes investimentos de uma vida inteira, são entregues nas mãos de pessoas sobre as quais a massa condominial não sabe, e também não se importa em saber se o candidato a síndico é possuidor das mínimas condições técnicas, intelectuais e outros atributos imprescindíveis para o exercício dessa atividade, ignorando o risco de levar à condução da gestão condominial pessoas despreparados para o exercício do cargo, que, ao deixar de cumprir suas atribuições, geram prejuízos para toda massa condominial, tais como perda de garantias da construção e seus assessórios, perda de prazos contratuais, descumprimento de obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias, tomadas de decisões equivocadas que fragilizam a segurança jurídica, submetendo o condomínio a obrigação de indenizar terceiros por danos morais e ou materiais, além de submeter constantemente vidas humanas a riscos decorrentes da manutenção precária da edificação.
Em um cenário ainda repleto de dúvidas, muitos questionamentos surgem no cotidiano condominial, como por exemplo quem pode ser síndico. Ressalvando os condomínios em multipropriedade, constituídos no temos da lei 13.777 de 20/12/2018, que em seu artigo 1.358/R, exige que sua administração seja por um administrador profissional a norma legal é muito clara no artigo 1.347, CC, permitindo que, por direito, qualquer pessoa poderá ser síndico, seja pessoa Física ou Jurídica, condômino ou não, apesar da controversa e ilegal exigência em algumas convenções para que somente proprietário de unidade privativa possa ser síndico, ressaltando ainda que, apesar desse mesmo artigo terminar que o síndico seja o administrador do condomínio é descabido a exigência de registro em qualquer órgão de representação profissional, inclusive no CRA / CFA, como assim garante a Constituição Federal no seu Artigo 5º, inciso XIII o livre exercício de qualquer atividade não regulamentada por lei, contudo, na prática, independentemente de o candidato ser condômino ou pessoa estranha ao condomínio, física ou jurídica, deve a assembleia observar o perfil pessoal do gestor, sua capacidade técnica, conhecimento acadêmico, além da estrutura empresarial, quando se tratar de pessoa jurídica, de forma a garantir que o síndico a ser eleito esteja habilitado para exercer suas 6 atribuições com competência e o profissionalismo que o cargo requer, pois, “… condomínio é coisa Séria!”.
Destacamos que, quanto ao profissionalismo, ou seja, obrigação de conhecer as normas legais, convencionais e técnicas de gestão, não há diferenciação entre “síndico profissional” e “síndico condômino”, servindo as nomenclaturas apenas para diferenciar aquele que exerce essa atividade com fim laboral, como meio de subsistência econômica, daquele condômino que exerce o cargo apenas pelo interesse de preservação da sua propriedade, mesmo que seja remunerado para tal.
Outra questão de grande relevância é que não existe diferença na forma de eleição e destituição do síndico, ou seja, ambos estão submetidos ao crivo da assembleia, conforme determina o CC, o artigo 1.347, para eleição e 1.349 para sua destituição, assim como, nas duas situações, o síndico não tem subordinação, jamais terá vínculo empregatício com o condomínio e a relação jurídica não perde sua natureza de mandato eletivo, não podendo o síndico ser indicado ou “mandado embora” sem que passe por deliberação da maioria simples dos condôminos em assembleia regularmente convocada.
Sem fazer qualquer distinção, o artigo 1.348 do CC, elenca, exemplificativamente, um rol das atribuições administrativas do síndico, e, apesar da importância da gestão de conflitos, elas vão muito além de dirimir questões de ordem pessoais entre os comunheiros, as quais podem ser delegadas a uma pessoa de sua confiança, diferentemente das responsabilidades inerentes ao cargo, que são pessoais e intransferíveis, ressaltando ainda que os atos praticados pelo síndico submetem todos os condôminos, razão pela qual a atividade de síndico, necessariamente, tem que ser tratada de forma técnica e profissional.
As discussões sobre a profissionalização do mercado condominial, especialmente da profissão de síndico, obrigatoriamente, passam pelo envolvimento de toda sociedade condominial e do Congresso Nacional, a fi m de elaborar normas jurídicas para seu exercício, definindo um conselho que, efetivamente, represente essa “categoria profissional”, atualmente avocada pelo CFA/CRA – Conselhos Federal e Regional de Administração, que, alegando a pratica de atos privativos do administrador na gestão condominial “resolveu”, de forma equivocada, ilegal e inconstitucional, através da resolução normativa, CFA número 654 de 12 de novembro de 2024, exigir que o síndico profissional tenha registro no respectivo conselho regional. Por outro lado, o CFC/CRC – Conselhos Federal e Regional de Contabilidade, alegam que, não obstante a legislação ainda não exija do condomínio a escrituração de “Contabilidade Real”, pois não está enquadrada como sociedade empresária, art. 1.179, CC, o controle das obrigações fiscais, previdenciárias, trabalhistas, prestação de contas constitui peça contábil, prerrogativa da profissão de Contador, criando uma Norma Técnica, “ITGI 2005”, dispondo sobre entidade de condomínio, estabelecendo um modelo contábil, impraticável no âmbito condominial. Nesse mesmo sentido a OAB – Ordem do Advogados do Brasil, por direito, na defesa de suas prerrogativas, vai além, avançando na demarcação territorial desse mercado, pleiteando, dentre outras coisas, a aprovação do Projeto de PL 1513/2021, buscando incluir a necessidade de visto de advogado no registro dos atos constitutivos de condomínio edilício (convenção e regimento interno).
A gestão condominial há muito tempo patinou as sombras do mercado imobiliário, preterido pelos principais segmentos econômicos e órgãos representativos, inclusive do Legislativo, que não demonstra interesse na regulamentação da profissão de síndico, como por exemplo a apreciação do PL 348 que tramita no Senado Federal desde 2018, que, embora tenha uma proposta ínfima diante das necessidades dessa atividade, daria um norte sobre sua habilitação profissional. Porém uma pequena luz vislumbra lentamente, ao observarmos que, atualmente, o mercado condominial foi descoberto como excelente nicho socioeconômico e amplamente disputado pelas mais diversas categorias profissionais, entretanto, ainda carente de normatização e segurança jurídica que possa levar ao fortalecimento do mercado capaz de dar ao síndico segurança jurídica e pessoal necessária no desempenho dessa profissão de relevante interesse social, fato que poderá ter um direcionamento quando todos que exploramos esse mercado deixarmos de ver apenas os bens que podemos dele extrair e passarmos agir coletivamente.
Claudionor Brandão
Contador especializado em condomínio, Corretor de Imóveis, Administrador e Advogado especialista em Direito Condominial. Diretor, fundador da CECAD Administração Condominial e da empresa C. Brandão Síndico Profissional, desde 1991.