As regras e o jeitinho brasileiro no condomínio

As regras condominiais, ao menos na teoria, foram criadas para manter uma convivência harmoniosa entre os moradores, sendo estabelecidas para evitar conflitos e manter a ordem e segurança no ambiente coletivo. No entanto, não diferente do que ocorre em sociedade, não é raro vermos em condomínio, a tentativa constante de burlar as regras, fazendo-se uso do famoso “jeitinho brasileiro”, no intuito de reinterpretar as normas de forma que prevaleçam os interesses individuais. Quem nunca se deparou com aquele condômino que resolve “privatizar” áreas comuns, utilizando arredores dos espaços reservados para eventos, muitas vezes como extensão do salão de festas ou churrasqueira, colocando mesas e cadeiras ou até mesmo utilizando o hall de entrada no seu apartamento para acomodar suas visitas ou para crianças brincarem?! Essas são pequenas manifestações do jeitinho condominial… Outro clássico comum nos condomínios, ocorrem nas vagas de estacionamento quando por diversas vezes nos deparamos com o morador espertinho que utiliza vaga reservada para visitante, vagas especiais ou até mesmo aqueles que estacionam seu veículo “invadindo” a vaga de outra unidade, usando as famosas desculpas “ah, mas é rapidinho” ou “eu estava com muita pressa, não vai acontecer novamente”.
Da série “jeitinho brasileiro”, não poderia ficar de fora o Síndico. Embora os síndicos devessem garantir o cumprimento das regras, ao longo do tempo, eles tendem a se tornarem “coniventes” com determinadas infrações, ou por falta de tempo de fiscalizar, ou por manter relação de “amizade”, fechando os olhos para excesso de barulho, ou festas que adentram a madrugada, deixando de multar os infratores, que muitas vezes, são reincidentes, em busca de “manter a paz”. Mas esse “jeitinho brasileiro” nem sempre é bem-sucedido. Quando o condomínio possui um sistema eficiente de monitoramento e penalidades, os infratores podem sofrer as consequências, vindo a sofrer notificações e/ou multas. Nesse momento, os moradores tendem a ficar criativos, na tentativa de escapar das multas, utilizando justificativas que, quase sempre, não fazem muito sentido. A pergunta é: até quando esse “jeitinho” não interfere na boa convivência no ambiente condominial? É claro que nem todo “jeitinho” é inofensivo; quando o mau comportamento de um morador, começa a prejudicar outros moradores, as pequenas infrações podem se tornar grandes fontes de conflito.
O jeitinho brasileiro reflete a complexidade que é conviver em sociedade, demonstrando que apesar de estarmos cercados de regras, há sempre uma brecha que cada um tenta explorar. Mas também nos faz refletir “até que ponto esse “jeitinho” é aceitável? ”. A verdade é que insistir nesse tipo de comportamento, pode vir a romper com o respeito mútuo e prejudicar a harmonia no ambiente compartilhado.
Priscila Ribeiro é advogada e sócia-proprietária do escritório Priscila Ribeiro Sociedade Individual de Advocacia, com atuação especializada em Direito Condominial, Contratual e Consumidor. Pós-graduanda em Direito Condominial pelo CBEPJur, membro da Comunidade de Experts em Condomínios – CEX | NE, Presidente da Comissão de Direito Condominial OAB Subseção Jaboatão dos Guararapes – PE e palestrante, com atuação nacional.