A redução do quórum para mudança na destinação do condomínio edilício
O mercado imobiliário promove a organização espacial, com novas formas de ocupação da propriedade e melhor aproveitamento econômico das áreas disponíveis. Requer equipamentos urbanos, estrutura para deslocamento de pessoas, capitais, produtos e serviços. A urbanização é um processo de ampla significação, atendendo a necessidades decorrentes de trabalho, lazer, moradia, produção e circulação de pessoas.
O condomínio edilício é uma decorrência do processo de urbanização, intenso e acelerado, impulsionado no primeiro quartil do século passado. A verticalização das cidades tem suas causas na industrialização, novas tecnologias construtivas, crises de urbanização, êxodo rural, encarecimento dos terrenos disponíveis para edificação e a necessidade de fixar as pessoas nas regiões centrais, próximas dos seus locais de trabalho. O condomínio em edificações por unidades autônomas é um modo de exercício do direito de propriedade, em comunhão com diversos titulares.
A legislação anterior exigia o quórum de unanimidade dos condôminos para modificar a destinação do condomínio edilício, transformando de comercial para residencial, por exemplo. Também exigia a unanimidade dos condôminos para alterar as áreas comuns em áreas privadas (fazer da antiga “casa do zelador” um apartamento, para ser vendido a terceiros). Esse quórum especial exigido em lei praticamente inviabilizava qualquer alteração na estrutura do condomínio, inviabilizando uma nova instituição.
É importante que a legislação acompanhe as modificações sociais, urbanísticas e econômicas. Nesse sentido, profundas modificações nas relações de trabalho, residência, deslocamento, consumo e lazer impuseram reestruturação espacial. O mercado imobiliário de grandes cidades requer renovação em seus centros. É fato que muitas edificações comerciais se encontram desocupadas, gerando perda do valor de uso da propriedade. Motivada por todo esse estado de coisas, atendendo a propositura legislativa de iniciativa de setores do mercado imobiliário, é aprovada a Lei 14.405/2022.
A lei reduziu o quórum para alteração da destinação do condomínio ou da unidade, bem como o de alteração nas áreas comuns, para dois terços dos condôminos, objetivando facilitar adequações que oportunizem melhor utilização da propriedade, motivadas pelo interesse coletivo, evitando a ruína econômica e arquitetônica de edificações comerciais, que se tornaram edifícios fantasmas nos centros de grandes cidades.
A questão merece uma análise mais complexa, pois envolve aspectos urbanísticos, sociais, econômicos e jurídicos. Em síntese, a constituição brasileira garante o direito de propriedade em seu artigo 5º, mas exige concomitante observância à sua função social (art. 5º, XXIII). No mesmo sentido, o Código Civil nos traz o direito à propriedade, porém estabelecendo uma série de condicionantes e ressalvas ao exercício desse direito (art. 1.228, §§ 1º a 5º).
O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais (Código Civil, Art. 1.228. § 1º). A propriedade que perde sua função de uso não atende às finalidades econômicas e sociais. A ineficiência é uma forma de injustiça, devendo ser privilegiado o interesse coletivo.
Francisco Egito é advogado, administrador, contador e especialista em Direito Imobiliário; coordenador da Comissão de Contabilidade Condominial do CRC-RJ; presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Condominial da 55ª Subseção da OAB-RJ; e diretor do Curso Aprimora e do CBEPJUR.