Minha Casa Minha Vida: quebrando tabus
Síndica mostra como gerir os muitos desafiose dificuldades dos condomínios criados pelo programa
Ana Paula Vieira
O programa “Minha Casa Minha Vida” surgiu durante o segundo mandato do governo Lula, em 2009, com a promessa de garantir uma moradia digna para as pessoas que não tinham um teto sobre suas cabeças, a solução para um grave problema social. Num primeiro momento, a execução parecia estar caminhando sem problemas. Contudo, anos depois, o cenário foi alterado.
Atualmente, diversas questões podem ser apontadas dentro dos condomínios do Minha Casa Minha Vida, como criminalidade, golpes financeiros, problemas estruturais e até mesmo a localização, que em algumas situações estão muito longe dos centros urbanos.
Mas, afinal, o programa de habitação deu errado? Não há mais volta? Só é possível achar as respostas para essas perguntas e tantas outras que cercam o tema com a palavra de quem viu e continua enxergando tudo de perto. Por isso, a REVISTA DOS CONDOMÍNIOS falou com uma profissional ímpar, a síndica dedicada e empresária Ana Paula Vieira, a respeito do tema.
Ela reconhece que o projeto é muito bom, mas a partir do momento em que é feita a entrega das chaves, os problemas começam a aparecer. Como o poder público não faz o acompanhamento, Ana Paula informa que licitações são abertas para que empresas de administração de todo o país possam assumir esses edifícios. “A cultura do Sul, por exemplo, é totalmente diferente da do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense. Eles queriam levar papéis para as assembleias, e os condôminos não liam, davam para os filhos fazerem aviões. Então, são pessoas com culturas diferentes que não entendem as verdadeiras necessidades. Você tem que acompanhar toda implantação, fazer o levantamento da estrutura do lugar”, disse.
E esse último ponto abordado pela síndica é muito importante. Afinal, como mencionamos anteriormente, a distância dos centros urbanos é um problema. Por isso, ela informa que alguns itens precisam ser checados antes, como a proximidade do local de escolas, postos médicos para exames, transporte que pode comportar os novos moradores. Esse levantamento, quando não é feito, acaba criando diversos “buracos” que precisam ser preenchidos.
“Será que as empresas onde os chefes de família trabalham vão aceitar adicionar mais uma passagem? As indústrias que estão próximas do Minha Casa Minha Vida possuem programas de Jovem Aprendiz?”, questionou Ana Paula a respeito do local de escolha para a implantação dos condomínios.
Recentemente, inclusive, notícias foram veiculadas na grande imprensa dando conta da situação de alguns condomínios na Zona Oeste do Rio de Janeiro, que teriam sido “assumidos” por grupos de milícias, com rondas feitas por supostos grupos de segurança, e fazendo cobrança de taxas dos moradores. A Draco (Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas) e a Delegacia de Combate às Organizações Criminosas e à Lavagem de Dinheiro) da Polícia Civil do Rio de Janeiro investigam a situação. “Existem pessoas que entram na brecha que o Poder Público não cuida”, disse a entrevistada.
A síndica também nos informou que as reportagens citadas fizeram com que a forma de gestão desses condomínios mudasse para todos os síndicos que atuam especialmente na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. Seja pelo transporte ilegal ou pelas ligações clandestinas para que os moradores tenham acesso à água, existem pessoas que estão realizando as tarefas que são de responsabilidade do Poder Público. “Se o Poder Público fizesse o seu trabalho de casa, se posicionasse, talvez não chegasse a esse ponto”, comentou.
Chama a atenção um termo utilizado por Ana Paula: “Humanização.” O trabalho do síndico que atua no Minha Casa Minha Vida é muito diferente daquele que está num condomínio “comum”. “Nos conjuntos de baixa renda, porque, afinal, o MCMV apresenta diversas fases, é necessário criar soluções diferentes. A inadimplência também existe ali, mas no conjunto habitacional é necessário conferir o motivo do atraso. Às vezes, é preciso fazer acordos que não estão no Código Civil. Esses acordos são as pessoas pagando o que devem com trabalho, porque os adultos, com nove crianças dentro de casa, mal têm o dinheiro para comer porque estão desempregados. Eu preciso ensinar empreendedorismo. Na época que eu era síndica no meu condomínio, eu falava para eles que tinha, no mínimo, 299 clientes.”
Hoje já é possível ver os frutos dessa mudança de postura feita pela síndica. Ela nos conta também que moradores que não possuem filhos, por exemplo, transformaram o quarto vago num minimercado, mostrando que existem várias formas de empreender.
Ana Paula não mediu palavras para mostrar que as pessoas ali presentes são trabalhadores honestos e não oferecem perigo à segurança de ninguém, assim como na maioria dos condomínios que existem pela cidade. Afinal, todos os processos de segurança também estão presentes no Minha Casa Minha Vida. “Se tem condição de colocar câmera, eles vão ter câmera, mas depende da cota condominial. Mas as casas têm grades caso as pessoas estejam viajando, são procedimentos normais. As pessoas têm uma visão que precisa mudar a respeito do Minha Casa Minha Vida. Acham que tem pichação, que direitos são violados, e não é isso o que acontece. Nós, condôminos, nos respeitamos”, finaliza.
Ana Paula Vieira tem experiência de 33 anos na área comercial, é sindica profissional especializada em condomínios MCMV (Minha Casa Minha Vida); CEO do Projeto Chá das Sindicas Empreendedoras Brasil e empresária da Fênix Certificadora Digital.
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