É hora de ressignificar o lixo dos condomínios

A aposta na coleta seletiva e numa política consciente de descarte e reciclagem traz ganhos para o próprio condomínio, a saúde da coletividade e, sobretudo, para o meio ambiente

 

Raquel Pires

Dependendo do tamanho da unidade ou do complexo condominial, toneladas de lixo podem ser geradas a cada semana. Você já parou para pensar na responsabilidade envolvida neste descarte? Como dar um bom destino ao lixo condominial? Como separá-los corretamente? É possível recuperar dinheiro para o condomínio com a venda de lixo reciclável? Há, de forma prática, como educar síndicos e moradores em torno da causa? A primeira a contribuir aqui, com a Revista dos Condomínios, para enriquecer esse debate fundamental é a coordenadora do Movimento Lixo Zero Goiás e embaixadora do conceito Lixo Zero na América Latina, Raquel Pires.

“A gestão correta do ‘lixo’ condominial é um tema de grande importância para a preservação do meio ambiente e para a saúde da população. No entanto, é comum que as pessoas confundam o termo ‘lixo’ com ‘resíduos’. Enquanto o primeiro é tudo aquilo que não tem mais utilidade e precisa ser descartado, os segundos são os materiais que podem ser reaproveitados ou reciclados”, inicia.

Segundo ela, para que o condomínio possa adotar uma política de lixo zero, é fundamental que a separação dos resíduos seja feita corretamente. Para isso, é necessário que haja uma divisão em, no mínimo, três categorias: orgânicos, recicláveis e rejeitos. Os orgânicos são os resíduos que podem ser transformados em adubo, como restos de alimentos. Os recicláveis são aqueles que podem ser reinseridos na cadeia de produção, como papel, plástico, vidro e metal. Já os rejeitos são aqueles que não podem ser reaproveitados ou sua reciclagem ainda é difícil, como fraldas e papel higiênico.

“Além de ser uma prática ambientalmente correta, a adoção de uma política de lixo zero traz inúmeros benefícios para o condomínio. A primeira vantagem é a redução de custos com o descarte do lixo, uma vez que o lixo orgânico (maior porcentagem) pode ser reaproveitado como adubo e os materiais recicláveis podem ser vendidos para empresas que trabalham com reciclagem. Assim, é possível recuperar dinheiro para o condomínio com a venda dos recicláveis e economizar com saco de lixo. Outra vantagem é a melhoria da imagem do condomínio perante a comunidade e a sociedade em geral, uma vez que a política de lixo zero demonstra preocupação com a preservação e a saúde da população. Além disso, a educação ambiental dos envolvidos, como funcionários, colaboradores, moradores e administração, é fundamental para garantir o sucesso da política de lixo zero”.

Raquel Pires afirma que, sim, os síndicos têm um papel importante na conscientização dos moradores sobre a importância da separação correta dos resíduos e na implementação de práticas sustentáveis no condomínio. Os funcionários também devem ser capacitados para realizar o correto encaminhamento. “É importante lembrar que a gestão correta do lixo é uma responsabilidade compartilhada entre todos os envolvidos no processo. De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, é responsabilidade da administração do condomínio implementar a gestão adequada dos moradores, para separarem e destinarem corretamente os resíduos, e das empresas ou cooperativas que trabalham com reciclagem, de forma a garantir a destinação adequada dos materiais recicláveis”.

Responsabilidade compartilhada – A gestão correta do lixo é uma responsabilidade compartilhada e que todos devem fazer sua parte para garantir o sucesso da política de lixo zero no condomínio. “É preciso conscientizar os moradores sobre a importância da separação correta dos resíduos e das práticas sustentáveis, como a redução do consumo de plástico, o correto encaminhamento do óleo de cozinha usado, a economia de energia elétrica entre outros. A implementação de um programa de compostagem também pode ser uma excelente opção para reduzir a quantidade de resíduo orgânico e produzir adubo para o condomínio. A política de lixo zero não apenas beneficia o meio ambiente, mas também pode gerar economia financeira a longo prazo”.

Portanto, resume Raquel, é importante que síndicos, moradores, funcionários e administradores trabalhem em conjunto para implementar uma política de lixo zero eficiente e educar a todos os envolvidos sobre a importância da separação correta dos resíduos e das práticas sustentáveis. Assim, é possível contribuir para a preservação do meio ambiente e para a saúde da população, além de gerar economia financeira para o condomínio.

Gabriel Brito

Engajamento que faz a diferença

Engenheiro Ambiental e CEO da CYGLE Ambiental, Gabriel Brito também conversou com a Revista dos Condomínios. “Dar um bom destino ao lixo condominial significa buscar alternativas e esgotar todas as possibilidades de reutilização, tratamento ou reciclagem dos materiais descartados pelo condomínio, com a intenção de reduzir os impactos ambientais e sociais negativos do descarte incorreto do lixo. O principal descarte proveniente dos condomínios é o próprio lixo domiciliar, composto por materiais recicláveis, especiais, orgânico e rejeito/não reciclável. Cada um deve ser encaminhado para um local diferente”.

Ele explica que a prática da venda do lixo reciclável indica um ponto característico no processo de coleta seletiva de um condomínio. Para que ocorra a venda, é necessário que os papéis, plásticos, vidros e metais não estejam armazenados juntos como de praxe, mas separados. Na prática, isso significa que um funcionário precisa coletar o lixo reciclável dos moradores e realizar um processo de triagem mais minucioso dentro do próprio condomínio, geralmente separando em plástico duro, plástico fino, PET, vidro, papelão, papel, alumínio, ferro.

Quanto tempo o funcionário do condomínio leva para realizar esta triagem? Qual é o grau de salubridade do local utilizado para realizar a triagem e armazenamento dos materiais? Quanto o condomínio gasta para colocar um funcionário nesta atividade? O funcionário tem equipamento de proteção individual condizente? Esta atividade está dentro do escopo do funcionário? Ele está ganhando adicional de insalubridade em grau máximo (40%) para esta atividade? O processo de coleta seletiva visando a venda do lixo reciclável está de fato valorizando o condomínio com sustentabilidade? Botando na ponta do lápis, o condomínio ganha dinheiro no final das contas? Todas essas perguntas devem ser respondidas pelo administrador, aponta Gabriel.

“Apesar de se fazer necessário ver os números através do balanço entre receitas e despesas, existem riscos desnecessários que o condomínio corre ao realizar este tipo de coleta seletiva, que podem trazer dores de cabeça muito maiores no futuro. Riscos de acidente e contaminação, pois o funcionário pode se cortar, contrair uma doença, realizando a separação do lixo dos moradores. Trabalhistas, pois ele pode acionar o condomínio na justiça alegando desvio de função e solicitar retroativo, caso não esteja ganhando o adicional de 40%. Segundo ementa do JusBrasil, a separação de lixo em condomínios é uma atividade que pode ser equiparada aos profissionais que trabalham com a coleta e industrialização do lixo urbano. Consequentemente, geram direito ao adicional de insalubridade em grau máximo, com respaldo no Anexo 14, da NR 15, da Portaria 3.214/78 do MTE. O funcionário do condomínio que simplesmente coleta os sacos e leva para o depósito se encaixa na lei e não é necessário o pagamento de insalubridade em grau máximo”.

Além dos riscos, quando o condomínio foca em catequizar e treinar o funcionário para ficar separando lixo, a gestão acaba desfocando do principal ponto para o sucesso da coleta seletiva, que é a comunicação efetiva com os moradores através da educação ambiental e conscientização. Portanto a prática da venda do lixo reciclável em condomínios deve ser bem estudada e bem avaliada em sua viabilidade, antes de ser implementada, para que nem o síndico e nem os moradores sofram com as consequências. Mas, e sobre os moradores?

“Não adianta só educar. Tem que engajar. Para isso é preciso de definição de processos de descarte e comunicação recorrente em vários canais. Sem processo de descarte definido não existe como os moradores se engajarem na causa. Sem comunicação recorrente, não existe mudança de cultura, que é o que todo condomínio busca, uma cultura de descarte que seja mais sustentável, mais limpa e organizada. Síndicos devem definir o processo de descarte e comunicá-lo aos moradores. Pode ser feito um comunicado, um treinamento, um manual, uma placa de sinalização… Qualquer ação pode gerar resultados, e a combinação delas potencializa o alcance”, defende Gabriel.

Conceito da sustentabilidade é amplo

Além de falar sobre o processo de descarte, é interessante trazer conteúdos diversos sobre outros resíduos, sobre as iniciativas do condomínio em sustentabilidade, e sobre quem o condomínio ajuda com o descarte correto do lixo reciclável. A ideia é manter todos em contato com a temática para que isso faça parte do cotidiano da comunidade. “A cereja do bolo é poder mostrar relatórios com o resultado da coleta seletiva o seu impacto ambiental e social positivo para o mundo. Tudo isso pode ser comunicado através de grupo de WhatsApp da administração, app da administradora, displays de elevadores, redes sociais do condomínio… Utilize todos os meios possíveis para alcançar mais moradores. Seguindo essas dicas, 99% de chance de grande parte dos moradores participarem ativamente da coleta seletiva, separando corretamente seus resíduos e trazendo benefícios incalculáveis para o condomínio e a sociedade”.

Como fazer a correta destinação do lixo?

Recicláveis

Papéis, plásticos, vidros e metais
O ideal é que sejam encaminhados a uma Cooperativa de Catadores, que realiza a 1ª etapa do processo de reciclagem.

Especiais

Pilhas e baterias, óleo vegetal usado, eletroeletrônicos, lâmpadas, medicamentos vencidos
Cada um destes resíduos deve ser encaminhado para ecopontos ou empresas que realizam o processo de tratamento e/ou reciclagem.

Rejeitos

Lixo de banheiro, fraldas

São os materiais que, atualmente, não possuem alternativas para reutilização, tratamento ou reciclagem. Devem ser encaminhados para um aterro sanitário, onde serão enterrados.

Orgânicos

Restos de comida no geral
O ideal é que sejam encaminhados para a compostagem, processo que transforma o resíduo orgânico em adubo de alta qualidade.

Contatos

Gabriel Brito

@cygleambiental

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gabriel-cygle-ambiental

Raquel Pires

@movimentolixozerogoias