Delivery com segurança

Aumento dos serviços de entrega em domicílio traz mais riscos à segurança condominial

Maykel Luduvice

Um dos fenômenos da pandemia, e que parece que veio para ficar no cotidiano da maioria das pessoas, é o aumento na utilização do serviço de entrega em casa de produtos diversos – especialmente, lanches e refeições. Nas ruas, por todo o país, o disfarce de entregador tem sido um dos mais utilizados por bandidos para a prática de assaltos, alguns deles resultando até em latrocínio. Como esse boom nos serviços delivery tem impactado o cotidiano dos condomínios e dos funcionários, em especial, os porteiros? Quais medidas e protocolos devem ser adotados para não expor os moradores a riscos e permitir que os entregadores sejam respeitados e possam realizar seu trabalho? A criação de espaços para o recebimento e armazenamento das encomendas entregues é uma boa saída?

O delivery traz consigo uma gama de riscos, e aqui atenho-me ao prisma da segurança. O principal objetivo da Segurança Condominial é atuar preventivamente na preservação de vidas em complexos residenciais ou comerciais. Todo princípio operacional possui um foco principal, que define as prioridades das tomadas de decisão. Sendo mais específico, em um cenário condominial, o foco primordial é a vida. É salutar deixar clara essa demanda, pois existem contradições com a segurança patrimonial que, no caso, assume a segunda posição de relevância”, avalia Maykel Luduvice, bacharel em Segurança Pública, especialista em Gestão Institucional de Segurança e pós-graduado em Ciências Jurídicas, além de capitão da PM de Sergipe, consultor, escritor e master-coach Integral Sistêmico em Alta Performance.

“Todo e qualquer serviço que demande maior fluxo de pessoas gera naturalmente um foco de atenção para o gestor de segurança, seja ele síndico ou não, pois há condomínios em que o síndico acumula essa função, e outros onde a pasta de Segurança é de responsabilidade de uma Comissão, formada por moradores ou profissionais especializados. Frise-se que a segurança é responsabilidade de todos e dever dos funcionários do condomínio, ou seja, não se resume somente ao porteiro, mas a todos que compõem o quadro de funcionários. De fato, a portaria é o acesso mais sensível, por isso essa modalidade delivery tem atormentado muitos porteiros e sugado a energia dos gestores condominiais, que precisam ter em mãos a Análise de Riscos do complexo residencial ou comercial e, a partir deste ponto, traçar as diretrizes.”

 O especialista reforça que seria leviano afirmar que todo prestador de serviço delivery é uma ameaça real. Entretanto, diz ele, o que pode clarear qual posicionamento tomar diante dessa lacuna é criar protocolos. A solução não finda em simplesmente permitir que o entregador entre ou não no condomínio. Afinal, estamos falando de uma manobra comercial que tem se tornado cada vez mais presente no dia a dia do cidadão. Não há como impedir essa avalanche de prestação de serviço, que se apresenta não mais como um artigo de luxo, mas um costume. Quase uma necessidade.

“Assim, é imprescindível que todo condomínio obtenha sua Análise de Riscos, pois seria contraproducente estabelecer uma proteção de algo que não se tem clareza de que possa ser um risco. O senso comum não pode ser o fiel da balança nesse cenário. Partindo dessa premissa, coloco em destaque os procedimentos a serem adotados – o processo de definição das responsabilidades de cada funcionário, conscientizando-os da importância de estarem atentos e alertas a qualquer movimento estranho ao convívio condominial, e das respostas que cada situação requer.”

O tripé da segurança

  1. Adoção de procedimentos de segurança pelos funcionários e condôminos, tanto na prevenção quanto no combate ao crime;
  2. Adequação de infraestrutura física criando acessos específicos para essas atividades;
  3. Utilização de sistema de monitoramento eficiente, que consiga registrar e identificar com clareza os atores de uma eventual cena de crime.

Funcionários devem ser capacitados em Segurança Condominial

Maykel Luduvice orienta todos os funcionários a fazerem uma capacitação em Segurança Condominial, mesmo que o condomínio já possua uma equipe específica. É comum, nesses casos, os funcionários não saberem como agir depois de um sinal de pânico ou de um alerta por parte da equipe de segurança. Fator importantíssimo desse passo é o poder de flexibilização, para atender as demandas que cada caso requer. Eliminar todos os riscos à segurança é o foco de qualquer gestor. Contudo, se não houver uma busca constante para esse fim, esse objetivo estará fadado ao insucesso, haja vista que o crime é dinâmico. O método que você utiliza para neutralizá-lo hoje poderá não ser eficaz de uma próxima vez.

“Sendo assim, a minimização de riscos seria um termo mais adequado. A avaliação da infraestrutura é uma forma de minimizá-los. A portaria é o acesso que apresenta mais fratura na segurança, e essa percepção é mais comum pelo uso do fator humano, que tem seus argumentos – a favor e contra. Até porque uma portaria remota nesse contexto poderia ser uma solução, mas, sem a participação ativa de cada morador, ela não teria o alcance desejado. A construção de espaços próprios para recebimento e armazenamento das encomendas pode, sim, agregar respaldos positivos, no que tange à não exposição do condômino a situações maiores de riscos.”

Nesse contexto, a responsabilidade da portaria seria somente notificar o condômino da chegada do produto solicitado, e o próprio faria o resgate deste, onde o acesso do prestador, por medidas de segurança, seria limitado à clausura de visitantes e prestadores de serviço. Esse espaço, por sua vez, deve conter um passador de produto para encomendas de pequeno porte, que possibilite o pagamento por maquineta ou em espécie, com mínimas possibilidades de abordagem física. Dessa forma, seria minimizado o risco da prática do roubo por essa modalidade.

“Criminosos, a todo instante, procuram burlar o sistema de segurança, e uma dessas ações é o uso de disfarces. Os mais comuns são mulheres grávidas, ou aparentando gravidez, prestadores de serviços essenciais, como água, luz, gás e Correios, técnicos de telefonia e canais de TV, e os entregadores. Nenhuma dessas funções identifica a pessoa como criminosa, é claro. Porém, o uso habitual de disfarces dessas funções pelos criminosos tem gerado medidas de segurança contra o hábito do disfarce, e não as funções em si. Mas não dá para confundir procedimentos de segurança condominial com desrespeito. As medidas precisam ser técnicas, objetivas e claras, sem expor os profissionais a situações vexatórias”, alerta o entrevistado.

Maykel aponta um tripé de fatores que inibe com mais eficácia as ocorrências de crime nos condomínios. “Uma vez que se amplia a entrada desses prestadores, sem um protocolo de identificação dos mesmos, sem o acompanhamento de destino e retorno do destino, abre-se um leque de possibilidades de condutas criminosas. Se os condôminos aprovam o acesso, também devem possuir metodologia para obter a aprovação de seus trabalhos na assembleia, com base na Análise de Risco, tomando conhecimento de suas principais ameaças e entendendo a necessidade de uma postura preventiva e sua conscientização.”

Por isso, ressalta ele, é importante definir um Projeto de Segurança, que avalie os três subsistemas da segurança condominial (Infraestrutura, Equipamentos Eletrônicos e Procedimentos), que devem trabalhar sinergicamente, minimizando as suas deficiências, estabelecendo e treinando constantemente os Procedimentos Operacionais Padrão (POP). O auxílio de um consultor em Segurança Condominial, dotado de conhecimento técnico e atualizado, é indispensável para essa realização. “Afinal, quem falha em planejar, está planejando falhar”, conclui.