Garagem não é depósito, tampouco lava-jato

Regras de uso do espaço precisam ser definidas em assembleias e constar das convenções, prevendo, inclusive, penalidades aos infratores

Caio César Mota

Restrições de uso da garagem costumam ser um fator de conflitos em condomínios. Afinal, por que deve ser proibido lavar o carro nesses espaços? Especialistas falam, sobretudo, em questão de segurança, pois podem acontecer acidentes. Há ainda o custo do consumo da água. E as regras sobre o que pode ou não ser guardado ali. Algumas garagens, por vezes, viram verdadeiros depósitos de produtos, caixas, geladeiras velhas, móveis usados, cadeiras e barracas de praia… Como essas questões devem ser definidas? O que diz a legislação? Onde regras devem ser estabelecidas? E quais penalidades podem ser aplicadas nos casos de flagrante desrespeito?

Caio César Mota é sócio-fundador do escritório de Advocacia que leva seu nome, além de coordenador da Especialização em Direito Imobiliário da PUC-GO, estado onde atua. Ele inicia sua participação nesta matéria esclarecendo que os abrigos de veículos, ou simplesmente garagens, podem ser divididas nos condomínios em três diferentes tipos. “Há vagas autônomas, aquelas que possuem matrícula própria no Cartório de Registro de Imóveis; vagas vinculadas, casos em que a matrícula da garagem é a mesma que a da unidade imobiliária, estando, portanto, a garagem vinculada à sua respectiva unidade; e vagas de área comum. que são aquelas que não possuem matrícula própria, sendo de livre uso dos moradores e integrando as áreas comuns”, afirma ele, que segue em sua análise. 

“No que diz respeito à lavagem de veículos nas garagens, vale dizer que a lei de regência, como era de se esperar – por se tratar de norma de direito privado de natureza aberta –, deixou a cargo da massa condominial, através de decisão colegiada, dispor a respeito. Agora, é bem verdade que, ao longo dos mais de 16 anos atuando junto a condomínios, raras vezes me deparei com normas internas que cuidassem com o necessário rigor e amplitude a respeito do tema garagens.”

Mas, então, diante do silêncio da lei e dos normativos internos, como devem se posicionar o condômino e o síndico? É evidente que o método convencional de lavagem de veículos libera grandes resíduos de sujeira pelo local de higienização, podendo, em alguns casos, espalhar pelos espaços do condomínio combustíveis e óleos vazados de equipamentos dos veículos. “Além disso, as lavagens de veículos implicam em alto volume de consumo de água – média de 300 litros por cerca de meia hora. E, como se não bastasse, a prática corriqueira de lavadores de veículos é pela utilização de produtos altamente químicos, o que se torna extremamente nocivo à saúde daquela comunidade”, explica Caio.

Não por acaso, aponta nosso especialista, órgãos e secretarias de Meio Ambiente têm criado cada vez mais políticas proibitivas de liberação da prática convencional de lavagem de veículos, vedando a emissão de alvarás para essa modalidade de negócio. Desse modo, seja pelos resíduos deixados no solo ou poluentes depositados no ar, a prática pode causar sérios problemas aos moradores de condomínio. “Vale dizer, ainda, que as garagens devem estar discriminadas no regimento interno de condomínio como espaço exclusivo destinado à guarda de veículos, não podendo ser utilizada para finalidades outras, o que inclui depósito de objetos e lavagem de veículos, sob pena de multa.”

Se os moradores, de forma colegiada, decidirem por permitir a lavagem de veículos, o mais sensato é a adoção de um espaço próprio, por meio da utilização da ecolavagem. “Essa modalidade, também conhecida como lavagem a seco, é a prática de limpar os veículos com o uso de produtos naturais, como a cera de carnaúba e silicone, utilizando apenas algo em torno de 200ml de água por veículo. Assim, se o morador fica responsável por utilizar produtos naturais e preservar a área de lavagem dos veículos, evitando o procedimento caso o veículo automotor possua vazamentos, nada implicará em prejuízo de ordem financeira ou que atente contra a salubridade de moradores e prestadores de serviços.”

Por fim, considerando que tais medidas devem estar previstas no regimento interno, Caio César Mota afirma que compete aos moradores, de acordo com sua manifestação de vontade em assembleia, e observando o quórum previsto em convenção, decidirem sobre a possibilidade de procederem com a lavagem de veículos no condomínio e, em caso positivo, sob qual modalidade, em quais locais e com utilização de que tipo de produtos. “Recomendo estabelecer em regimento interno as penalidades pela inobservância do previsto na norma, em especial da utilização inadequada do espaço destinado à guarda de veículos, podendo o condomínio, nos casos de depósito de objetos inapropriados, promover a remoção e guarda em outro local, aos custos do morador infrator. E ainda lhe impor uma multa, caso não atendida a advertência prévia”, conclui.

REGRAS DE OURO PARA USO DAS GARAGENS

  1. Ter uma convenção clara e detalhada, definida em assembleia e apontando permissões e proibições. Tudo deve ser redigido de forma clara, sem deixar margem para dúvidas.
  2. Eleger um mediador. É esperado que o síndico morador exerça o papel de mediador de conflitos entre condôminos pelo uso do espaço. Caso o condomínio tenha uma empresa gestora (ou síndico profissional), pode ser destacado um morador como mediador.
  3. Ter vagas que contemplem moradores idosos e/ou com deficiência. Facilidade de acesso, proximidade dos elevadores, maior área de manobra para o automóvel. Regras básicas que devem ser respeitadas, em nome da civilidade.
  4. Utilização como depósito. Poucos condomínios contam com espaços próprios para que moradores guardem alguns pertences na sua vaga de garagem. Em outros, é permitido, por exemplo, pendurar bicicletas por apartamento na parede da vaga. Onde não há regras, abre-se espaço para que outros acabem ultrapassando os limites do bom senso, empilhando equipamentos e móveis velhos, e até invadindo a vaga alheia. Por isso, é fundamental que as regras sejam definidas e do conhecimento de todos.

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