Por uma transição sem turbulências e desarrumação
Momento de troca dos síndicos exige compromisso, transparência e planejamento, tanto de quem deixa o cargo, com daquele que assume a função
No Poder Executivo, os momentos de transição entre governos quase sempre são de tensão, em especial se o novo ocupante do cargo de prefeito, governador ou presidente estiver no espectro da oposição. Omissão de informações, contas em atraso, dívidas recentemente assumidas e caixa vazio, risco de descontinuidade, campanhas de difamação e fofocas. Nos condomínios, acredite, a troca do síndico também pode ser um momento difícil. Como fazer, então, para que tudo ocorra de uma forma harmoniosa? A troca de gestão no condomínio demanda atenção a pontos diversos, como prestação de contas e quadro de funcionários, sendo que toda a documentação deve estar em dia. E quais são as obrigações imediatas de quem entra e de quem sai da função?
“Por mais que a comparação entre a troca de governos e gestões condominiais seja válida, é bom lembrar que, quanto aos cargos públicos do Poder Executivo, o pleito acontece sempre em outubro, e o eleito assume em janeiro do ano seguinte. Nos condomínios, o novo síndico já toma posse imediatamente, o que torna tudo bastante desafiador. A transição harmoniosa é o sonho de consumo de todo síndico profissional, mas o gestor deve estar preparado para enfrentar situações adversas, logo em sua chegada. Por experiência própria, posso afirmar que síndicos orgânicos não costumam sentar-se com o novo ocupante do cargo para suavizar a troca da gestão”, lamenta Marcio Barbalat, síndico profissional e ex-diretor da empresa TED – Serviços de Cobrança.
Nosso entrevistado entende que, se não constitui uma obrigação legal, é um grande diferencial de um síndico profissional saber lançar mão dos meios disponíveis para tomar conhecimento prévio da situação do condomínio que se pretende assumir, até mesmo para que se possa avaliar o custo x benefício e o valor da prestação do serviço. Como exemplo de atuação profissional, ele cita a forma de trabalhar da Horus Síndicos & Associados, empresa especializada na gestão profissional de condomínios, à qual é associado desde 2016.
Antes de remeter uma proposta de prestação de serviços a um condomínio, solicitamos, a quem nos recomendou, que nos envie a cópia dos últimos balancetes, para que se possa ter ciência de assuntos de suma importância, como valor da cota condominial, eventual inadimplência, saldo bancário, quitação de impostos, entre outros pontos relevantes. Também é possível emitir certidões gratuitas pela internet, para saber se o condomínio é réu em ações judiciais ou se possui débitos inscritos em Dívida Ativa. São cuidados que, em nossa opinião, todo profissional precisa ter, para que entenda ‘onde está pisando’, e não inicie sua sindicatura às cegas”, explica.
Para Barbalat, aquele que pretende assumir a gestão de um condomínio não deve, simplesmente, enviar uma proposta, e aguardar sua possível eleição para, só então, buscar informações. Por mais que uma transição, para ser classificada como harmoniosa, exija de quem está deixando o cargo o auxílio e a transparência com informações e documentos, cabe ao síndico profissional fazer a sua parte, sendo proativo, tomando as medidas prévias, sem depender de terceiros, visando gerar o menor impacto possível para o condomínio, que sempre deve ser a prioridade do novo gestor.
“E mais uma observação sobre transição de gestões condominiais: não é função do novo síndico agarrar- -se à justificativas e buscar culpados por eventuais realidades desagradáveis, herdadas de administrações passadas. O síndico profissional foi contratado para encontrar soluções, e é nisso que deve se pautar, desde o momento em que assume a sua função, e independentemente de questões pretéritas”, aconselha nosso entrevistado, com formação pelo Sindiconet-SP; e cursos de extensão e gestão de condomínio pelo Instituto Pró-Síndico-SP; de Gestor de Facilites pela UFRJ; de Assembleias em Condomínio pela Abadi; e de Controles Financeiros pelo Sebrae.
Quais são as obrigações de quem deixa o cargo?
Sobre as obrigações de quem deixa o cargo de síndico, é sabido e lamentável que, na maior parte dos casos, aquele que encerra o mandato, simplesmente, não promove mais qualquer esclarecimento, seja a quem está assumindo a função, seja à coletividade. Não há uma cultura de transparência e colaboração. A Horus, por sua vez, ainda que não espere reciprocidade dos demais, sempre entrega uma pasta-arquivo ao condomínio cuja administração está deixando, contendo um índice e toda a documentação de seu mandato, do início ao fim, para facilitar e pavimentar o caminho do próximo síndico, e permitir que a transição ocorra, realmente, de forma harmoniosa.
Perguntado sobre as obrigações imediatas de quem entra na função de síndico, o especialista diz que esse é um assunto de pertinência ímpar, pois, por mais que o síndico profissional se cerque dos cuidados e busque tomar conhecimento, antecipadamente, da situação do condomínio, muitas vezes, acaba mesmo por se deparar com uma desagradável “caixinha de surpresas”. Afinal, determinadas informações só podem ser obtidas quando se toma posse do cargo. Se o trabalho de um síndico começa ainda nas pesquisas prévias, antes de enviar uma proposta a um condomínio, ele se torna verdadeiramente desafiador quando sua gestão tem início.
“A Horus elaborou um protocolo que vem se mostrando bastante exitoso, adotado assim que se assume a sindicatura de um condomínio. Primeiramente, é preciso estabelecer uma relação de parceria com a empresa administradora, para que se tenha acesso irrestrito a informações e documentos. A análise das pastas mensais é vital para o mapeamento de possíveis vulnerabilidades e urgências, que exijam ações imediatas. Busca-se o rápido entrosamento com o Conselho Consultivo e/ou Fiscal, pois o síndico não pode trabalhar sozinho. O apoio e o aval dos conselheiros são ativos importantes de uma bem-sucedida administração, e o pensamento de que estão todos no mesmo barco, com um objetivo em comum, precisa nortear esta relação, que nem sempre é fácil”, lista.
Além disso, afirma Marcio Barbalat, um bom gestor deve ter jogo de cintura, humildade, saber ouvir, e levar em conta a experiência dos membros do Conselho. Outra medida fundamental, quando se assume, é elaborar um checklist em todas as áreas: saber se o condomínio está em dia com suas obrigações trabalhistas e tributárias; descobrir se existem débitos perante a administração pública e/ou ex-funcionários, fornecedores, concessionárias e prestadores de serviços; tomar conhecimento de possíveis ações judiciais; checar questões relativas à autovistoria e atendimento às normas técnicas; estudar o quadro de funcionários e fazer cessar desperdícios e “farras” envolvendo escala e horas extras, que são comuns, entre outras medidas imprescindíveis.
“Enfim, somos da filosofia de que um síndico, ao assumir, deve entender, integralmente, os aspectos e as esferas que permeiam o condomínio, principalmente para evitar surpresas e poder agir, o quanto antes, na solução de problemas, e até convocando assembleia geral extraordinária, em questão de semanas ou de meses, a depender do resultado do checklist. O síndico, via de regra, é eleito em assembleia, quando os condôminos deliberam sobre o planejamento orçamentário. Entendemos que, ao tomar posse, ele se debruce sobre esses números, identifique possíveis fragilidades e, se necessário, proponha reajuste e/ou adoção de cota extra, em nome da previsibilidade e cautela que devem nortear seu trabalho”
Operacional e administrativo
A presença do síndico profissional nos condomínios, conversando com moradores e funcionários, entendendo suas necessidades, ouvindo insatisfações, é indispensável para a rápida compreensão da rotina condominial, auxiliando na identificação de possíveis conflitos, e permitindo solucioná-los da melhor forma. “No setor operacional, é importante que o gestor tente ganhar a confiança da coletividade e demonstre que está ciente das particularidades do local, bem como transpareça sua intenção de resolver problemas. Não deve se deixar levar por fofocas e ruídos, tampouco atuar para acirrar os ânimos, em vez de atenuá-los. O envio de relatórios periódicos, ao Conselho e aos moradores, é um bom meio de dar transparência, e evitar a disseminação de boatos e mal-entendidos”.
O departamento administrativo, por sua vez, deve cuidar da cotação de orçamentos dos serviços, fazer contatos por telefone e e-mail, e atuar junto às administradoras, enviando boletos e instruções, dando aval para pagamentos, checando o cumprimento de obrigações. “É um trabalho permanente de orientação e inspeção. No início de cada gestão recorremos, quando necessário, a escritórios de advocacia, para a análise de contratos com prestadores de serviço e identificação de eventuais desvantagens, excessos, injustiças e ilegalidades das quais o condomínio pode estar sendo vítima. Sendo este o caso, nós tentamos renegociá-los para condições justas. Se não for possível, buscamos empresas e profissionais de confiança, de modo a defender os interesses do condomínio”, conclui Marcio Barbalat.