Sanções aos inadimplentes: o que pode ou não ser feito?

Qual postura deve ser adotada pelo síndico em relação aos condôminos em atraso com o pagamento de suas cotas? Qual a melhor estratégia para lidar e resolver esse problema?

VANISI FERREIRA

Penas restritivas de direito aos condôminos inadimplentes: afinal, podem ser aplicadas restrições de uso de áreas e equipamentos? Quais? Os casos podem ser expostos nas reuniões e assembleias? O que diz a legislação? Esse é um caminho eficaz para resolver a questão, ou o diálogo é sempre o melhor caminho para tentar receber os atrasados? Por mais óbvias que essas questões possam parecer, elas costumam gerar dúvidas entre muitos síndicos e polêmicas entre os moradores, além de representar um baita desafio para a administração das contas do condomínio. A REVISTA DOS CONDOMÍNIOS volta a esse assunto tão importante atendendo aos pedidos dos leitores, trazendo desdobramentos tendo em vista ampla matéria que publicamos recentemente.

“Contribuir para as despesas do condomínio constitui o maior dever de um condômino para com a coletividade. Sem o aporte financeiro de cada um, o gestor fica impossibilitado de fazer a manutenção preditiva e o pagamento das obrigações mensais. Por isso, o condômino inadimplente incomoda muito os demais participantes do rateio, visto que ele vai de carona com os demais, usufruindo dos serviços e demais benefícios. Infelizmente, o modelo condominial proporciona que os adimplentes venham a suportar o furo de caixa”, inicia Vanisi Ferreira, advogada condominialista e presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB de Volta Redonda, município fluminense.

“As penalidades restritivas de direitos aos condôminos inadimplentes são as que o Código Civil estabelece no art. 1.335, que são a não participação e voto nas assembleias do condomínio, além do pagamento de multa e juros moratórios. Não há que se falar em restrições de uso de áreas comuns ou qualquer outro benefício que haja no condomínio. O próprio Código Civil já orienta o síndico, no seu art. 1.348, quanto à sua posição perante o inadimplente, que é ‘cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar multas devidas’. Vale ressaltar que o síndico precisa ficar atento a essas cobranças, utilizando com presteza sua assessoria jurídica, para que o caixa do condomínio não seja comprometido com a inadimplência”, explica nossa entrevistada.

Também membro da Comissão de Direito Condominial da ABA/ RJ, diretora regional da Anacon e presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB de Volta Redonda, Vanisi ressalta que outro cuidado necessário é não expor o inadimplente em quadros de aviso ou em circulares enviadas aos demais condôminos. Entretanto, dentro do ambiente da assembleia, os demais condôminos têm o direito de saber sobre todos os assuntos do condomínio, inclusive o valor da inadimplência e as unidades devedoras. Importante evitar nomes dos condôminos, apenas as unidades devedoras podem ser divulgadas na assembleia. “O síndico deve conhecer bem seus condôminos para encontrar a melhor maneira de coibir e resolver as questões de inadimplência. Um canal de comunicação pode ajudar a diminuir essa prática. Conhecer cada caso é importante para conduzir a melhor solução. O diálogo sempre é o melhor caminho, evitando maiores custos financeiros e emocionais”, aconselha.

VALESCA DA SILVA CABRAL

GERALDO GARCIA

Inadimplência atrapalha a boa administração dos condomínios

Mestre em Direito, pós-graduada em Advocacia Extrajudicial e em Direito Imobiliário, a advogada Valesca da Silva Cabral também conversou com a REVISTA DOS CONDOMÍNIOS. “Não há como negar que a inadimplência tem sido um dos grandes problemas para alcançar a boa administração nos condomínios. Não por acaso, os síndicos estão em constante busca pela almejada inadimplência zero. Acreditamos na influência de fatores financeiros, sociais e econômicos para interferir na ausência do pagamento das contribuições mensais por parte de alguns proprietários perante o condomínio”, contextualiza.

Num contexto histórico, Valesca lembra que, durante o Império Romano, a figura do devedor já se fazia presente, e os publicanos eram os responsáveis pela cobrança. O endividado se sentia desrespeitado pelo credor, por considerar que a dívida feria a lei de Moisés e, como se não bastasse, era cobrado por pessoas vistas como desonestas, devido à prática de extorsões e cobranças abusivas, além de serem associados com o próprio império que se enriquecia, enquanto o povo tornava-se cada vez mais miserável.

“Na atualidade, temos a impressão de que situação semelhante ocorre nos condomínios, pois alguns condôminos inadimplentes trazem consigo esse sentimento de injustiça quando confrontados com a apresentação da dívida. Talvez isso se explique por ignorarem a finalidade do rateio, que serve para demonstrar as despesas condominiais das áreas comuns. E o não pagamento implica em prejudicar os demais condôminos, tornando sua contribuição mensal mais onerosa”, lamenta.

Coautora do livro ‘Direito das Minorias’, pós-graduanda em Lei Geral de Proteção de Dados e em Direito e Gestão Condominial e membro da Comissão Nacional de Direito Condominial da ABA e da Comissão de Direito Condominial da OAB/DF, nossa entrevistada ressalta que a Lei nº 4.591/64, que dispõe sobre o condomínio em edificações, assevera, em seu art. 9º, §3º, alínea “d”, a importância da Convenção do Condomínio prever os encargos, forma e proporção das contribuições dos condôminos para as despesas de custeio e para as extraordinárias. No Capítulo III, desta mesma lei, dedicado às despesas condominiais, o artigo 12 e parágrafos demonstram a importância do dever do condômino em concorrer nas despesas do condomínio com sua parte. O art. 1.336 do CC complementa esse entendimento quando determina os deveres dos condôminos em contribuir para as despesas do condomínio e, caso não o faça, fica sujeito às sanções previstas, como, por exemplo, o pagamento de multas.

“Por outro lado, quando se trata em restringir direitos dos condôminos inadimplentes, não são somente os deveres descumpridos que devem ser levados em conta. Sabemos que os proprietários dos imóveis têm direito em usar, usufruir e livremente dispor das suas unidades e das partes comuns, conforme sua destinação, contanto não seja excluída a utilização aos demais compossuidores, como elenca o artigo 1.335 do Código Civil Brasileiro de 2002. Contudo, nesse mesmo artigo, inciso III, nota-se claramente a restrição de direito estabelecida ao condômino inadimplente que não poderá exercer o direito de participar e votar nas deliberações das assembleias, se não estiver quite com o pagamento das contribuições mensais de rateio do condomínio”, pontua.

Segundo Valesca, importante ressaltar que, mesmo o condômino estando na situação de inadimplência, não poderá ser constrangido ou exposto em situações desagradáveis no ambiente condominial, principalmente nas reuniões e nas assembleias, perante os demais moradores. Ela salienta que há decisões de Tribunais que entendem tratar-se de situação vexatória, pois fere direitos da personalidade, como a honra e a imagem, podendo configurar dano moral.

“Portanto, percebe-se que a imposição de multas e juros para forçar os pagamentos atrasados das cotas condominiais, bem como as penas restritivas de direito para os condôminos inadimplentes, não têm se apresentado como instrumentos eficazes para diminuir ou até mesmo acabar com a inadimplência. Acreditamos que se faz necessária a inclusão de medidas preventivas através de campanhas informativas no condomínio que possibilitem a conscientização coletiva para a valorização do patrimônio; além de conversas com os condôminos de maneira individual e coletiva e de reuniões informais por parte da administração do condomínio com o intuito de mitigar a inadimplência”, aposta.

Síndico profissional, Geraldo Garcia reforça esse entendimento. “Penas restritivas aos inadimplentes só podem ser aplicadas se aprovadas em assembleia e inclusas em item na convenção, enquanto os nomes desses condôminos não podem ser expostos nas reuniões e assembleias, para evitar constrangimento. A relação dos condôminos inadimplentes deverá ficar com o presidente e secretário durante as assembleias. Os inadimplentes, mesmo que presentes, não terão direito a voto, mas nunca devem ser expostos! O melhor caminho para resolver essas questões é sempre o diálogo! Todos têm o direito de se manifestar, e o síndico escutar, pois, para cada caso, pode e deve ser feita uma análise”, aconselha ele, síndico dos empreendimentos Stilo Shopping & Offices, Edifício Alcântara Trade Center, Edifício Barcellos, Penedo de Alcântara, Comercial Hardoim, Edifício Gaby Center e Edifício Advance, no estado do Rio de Janeiro.

Contatos

Valesca Cabral

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Vanisi Ferreira

@vanisiferreiradv

Geraldo Garcia

(21) 96456-5852