Locação por Curtíssima Temporada

Direito de Propriedade ou Risco Coletivo?
A popularização de plataformas digitais de aluguel por temporada transformou o mercado imobiliário e acirrou debates sobre a locação por curtíssima temporada em condomínios. Para alguns, trata-se de uma oportunidade legítima de rentabilizar seus imóveis. Para outros, um fator de risco à segurança e à harmonia condominial. O impasse gira em torno da difícil conciliação entre o direito individual de propriedade e o interesse coletivo dos moradores. Outro ponto a ser discutido é se a natureza jurídica desta operação, pois se assemelha a locação por curta temporada ou se seria uma hospedagem atípica.
Neste sentido, a Lei do Inquilinato (Lei 8.245/91) prevê a locação por temporada, mas não define um prazo mínimo, o que abre espaço para contratos de curta duração, até mesmo diários. O problema surge quando essa prática se aproxima da atividade comercial de hospedagem, o que pode violar normas condominiais e gerar insegurança jurídica. Decisões recentes do STJ reforçam a autonomia das convenções condominiais para regulamentar esse tipo de uso, permitindo a proibição quando a prática descaracteriza a destinação residencial do condomínio.
A locação por curtíssima temporada em condomínios traz desafios significativos, como a alta rotatividade de pessoas desconhecidas, dificuldades na fiscalização do cumprimento das regras internas e o aumento de problemas como barulho excessivo, mau uso das áreas comuns e riscos à segurança. Essa realidade entra em conflito com os direitos dos demais moradores ao sossego, saúde e segurança, conforme prevê o artigo 1.336, inciso IV, do Código Civil.
Outro ponto crítico é a possível descaracterização da finalidade residencial do imóvel. Em condomínios projetados para moradia, a locação frequente por meio de aplicativos pode se configurar como atividade econômica, destoando da destinação original da edificação.
O Código Civil reforça a importância da destinação do imóvel. O artigo 1.336, inciso IV, determina que cada unidade deve seguir o uso estabelecido para o prédio, enquanto o artigo 1.332 permite que a convenção condominial define regras sobre a utilização das propriedades. Com base nesses dispositivos, diversos condomínios têm adotado restrições ou até proibido a locação por curtíssima temporada, especialmente quando ela compromete a segurança e a harmonia do ambiente coletivo.
Enquanto o legislador não estabelecer diretrizes mais claras, caberá aos condomínios decidir seu próprio caminho, fortalecendo suas convenções e promovendo um debate transparente entre moradores e proprietários. Afinal, o desafio é garantir que a inovação e a liberdade de mercado não comprometam o direito ao sossego e à segurança da coletividade.
Francisco Machado Egito é advogado, administrador e contador. É CEO do Grupo Francisco Egito, empresa que atua na área condominial e imobiliária. É coordenador da comissão de Contabilidade Condominial do CRC e coordenador da UNICRECI. É diretor da Revista dos Condomínios, do curso Aprimora e do CBEPJUR. Tem atuação como presidente e membro de conselhos profissionais e associações na área condominial e imobiliária (OAB, CRC, ABA, CRECI e outros).