Dia Internacional da Mulher: Elas promovem condomínios fortes, diversos e informados
O dia Internacional da Mulher, celebrado no dia 8 de março, muitas vezes é reduzido a homenagens superficiais e entregas de flores. No entanto, sua origem remete a movimentos operários do final do século XIX e início do século XX, quando mulheres lutavam por condições de trabalho dignas, igualdade de direitos e respeito na sociedade.
ENTRE A HOMENAGEM E A LUTA
Segundo o artigo publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU , a data surgiu como resultado das reivindicações de operárias do setor têxtil, que organizaram greves e protestos exigindo jornada reduzida, melhores condições de trabalho e direito ao voto. Essa luta histórica reflete a realidade de muitas mulheres no mercado condominial atual: ainda precisam provar sua competência repetidamente, enfrentar resistência velada e superar desafios extras que não são impostos aos homens na mesma posição.
UMA MUDANÇA QUE INCOMODA
No Brasil e no mundo, as mulheres há muito tempo deixaram de ser coadjuvantes no mercado de trabalho para assumirem posições de liderança e decisão. No setor condominial, essa transformação se intensifica a cada dia. O que antes era um espaço majoritariamente masculino agora conta com síndicas profissionais, advogadas especializadas, engenheiras e administradoras que não apenas ocupam cargos de comando, mas redefinem o conceito de eficiência e estratégia dentro dos condomínios.
RESISTÊNCIA É MAIS UM DESAFIO
A sociedade — e, por vezes, os próprios condomínios — ainda resistem a aceitar que a feminilidade e a competência técnica caminham juntas. Mulheres no comando enfrentam desafios que vão além da administração de edifícios; precisam provar constantemente sua capacidade, lidar com preconceitos velados e demonstrar que sua presença não é concessão, mas sim necessidade para a evolução do mercado condominial.
E, para aqueles que ainda acreditam que a gestão de condomínios deve permanecer nas mãos masculinas, essa matéria traz uma provocação: por que a presença feminina incomoda tanto?
Para responder a essa e outras questões, o repórter da revista entrevistou cinco mulheres que se destacam no mercado condominial: Társia Smeha Quilião, Sabrina Krug, Mauren Regina Amaral Gonçalves, Letícia Andreolli Dias e Bruna Caram. Síndicas, advogadas e engenheiras que compartilham suas experiências, desafios e conquistas no setor, mulheres fortes, competentes e cujos currículos falam por si só. Por fim é necessário reforçar: o currículo tem que ser acima da média quando se é mulher.
A ENTRADA NO MERCADO CONDOMINIAL: MOTIVAÇÃO E PROPÓSITO
Repórter da Revista dos Condomínios: o que motivou você a atuar no mercado condominial?
Társia Quilião: “Sempre vi a necessidade de uma advocacia mais técnica e preventiva no setor condominial. Meu objetivo foi atuar diretamente na capacitação de síndicos e administradoras para evitar conflitos e trazer segurança jurídica para a gestão.”
Sabrina Krug: “Minha jornada começou dentro do meu próprio condomínio. Percebi que a gestão precisava ser mais profissional e organizada. Hoje, minha atuação se expandiu para nove cidades, provando que a sindicatura profissional é um caminho sem volta.”
Mauren Gonçalves: “Minha motivação sempre foi transformar a gestão condominial em algo mais eficiente e humano. Vejo que a empatia e a transparência fazem toda a diferença na administração de um condomínio.”
Letícia Andreoli Dias: “Minha atuação começou na engenharia civil, mas logo percebi que muitos dos problemas estruturais dos condomínios poderiam ser evitados com um olhar mais técnico desde o início.”
Bruna Caram: “O Direito Condominial me chamou a atenção por sua complexidade. Vi a necessidade de uma advocacia especializada que garantisse segurança tanto para os síndicos quanto para os condôminos.”
O PRECONCEITO AINDA EXISTE?
Repórter da RDC: Você já enfrentou preconceito por ser mulher no setor condominial?
Társia Quilião: “O preconceito não vem apenas de homens, mas também de outras mulheres. Muitas vezes, somos questionadas e testadas de maneiras que nossos colegas homens não são. Isso precisa mudar.”
Sabrina Krug: “Sim, já tive minha capacidade questionada de maneira sutil. Mas os números e os resultados falam mais alto que qualquer resistência.”
“Esse tipo de crença só se dissolve com posicionamento e dedicação, mostrando na prática que a gestão condominial eficiente não tem gênero – ela é construída com preparo, experiência e comprometimento”.
Mauren Gonçalves: “Claro. Logo no início das minhas atividades, dando assessoria em uma Ago, havia um advogado com diversas procurações, pois era proprietário de uma imobiliária e ele queria aprovar “Pintura Interna” em assuntos gerais. Eu me pronunciei e disse que não era assunto da pauta e que não poderia ser aprovado. Ele me olhou e perguntou se eu era advogada e respondi que era consultora, nesse momento ele pediu que eu me portasse como secretária.
Respondi que ele, com certeza, não tinha especialização na área de condomínios e citei a Lei 4.591 de 16/12/64. E ainda disse que faria constar em ata minha orientação e então os demais aplaudiram meu posicionamento. No dia seguinte o mesmo advogado queria me contratar para trabalhar para ele”. “Muitos ainda esperam que uma mulher na liderança seja mais ‘dócil’ ou ‘flexível’. Quando agimos com fi rmeza, somos vistas como ‘difíceis’ ou ‘autoritárias’.”
Letícia Andreoli Dias: “Já passei por situações em que precisei elevar minha voz para ser ouvida, enquanto colegas homens tinham suas palavras aceitas sem questionamentos.”
Bruna Caram: Sim, sem dúvida. O mercado condominial, assim como muitos outros segmentos do direito e da gestão, ainda carrega resquícios de uma cultura predominantemente masculina, onde muitas vezes a presença feminina precisa ser constantemente reafirmada para que o respeito e a credibilidade sejam conquistados. No início da minha trajetória, percebi que, enquanto um homem poderia ter sua competência presumida, eu precisava provar a minha expertise repetidamente, demonstrando preparo técnico, segurança nas decisões e postura firme para ganhar a confiança dos condôminos, síndicos e prestadores de serviço.
“Percebo que, no mercado jurídico, advogadas precisam demonstrar um nível de competência maior para conquistar credibilidade no setor condominial.”
A LIDERANÇA FEMININA COMO DIFERENCIAL
Repórter RDC: quais são os diferenciais da liderança feminina na gestão condominial?
Társia Quilião: “Acredito que muito além de intuição tem uma pluralidade de características que as mulheres possuem dentre elas a capacidade de ser “multifocal” enxerga o todo e a partir daí direciona os passos para a melhor decisão.”
Sabrina Krug: “Lidar com diferentes expectativas, perfis e interesses exige habilidade, paciência e estratégia, pois um condomínio é, antes de tudo, uma comunidade. Encontrar o equilíbrio entre as necessidades coletivas e individuais é um desafio constante, mas também uma das partes mais enriquecedoras deste trabalho.”
Mauren Gonçalves: “Empatia e comunicação eficiente são nossos pontos fortes. Saber ouvir e compreender as necessidades dos condôminos facilita a gestão.”
Letícia Andreoli Dias: “Nosso olhar técnico aliado à gestão nos permite antecipar problemas e evitar crises.”
Bruna Caram: “A abordagem colaborativa das mulheres torna a administração mais transparente e eficaz.”
Repórter RDC: a presença feminina não é futuro, é realidade, porém, a sociedade arraigada no patriarcado, machista desde os primórdios, precisa ensinar as mulheres também, pois, o que significa SORORIDADE?
Társia Quilião: Ainda há muito que se desenvolver, infelizmente as mulheres acreditam que outras mulheres são rivais e quando precisam apoiar umas as outras são as primeiras a apontar o dedo e julgar. Isso é histórico e cabe a nós mudarmos esta realidade para que o futuro se torne um mundo melhor em diversos aspectos, mas principalmente no desenvolvimento da empatia.
Já apoiei muitas mulheres e sempre continuarei apoiando, mesmo que do outro lado eu não tenha todo este apoio eu acredito que cada um mostra o que tem no coração e a vida segue, sem ressentimentos, porém sem acesso, simples assim. Eu continuo com o Clube de Partners que foi criado justamente por conta de eu identificar nos eventos que as mulheres apoiavam os homens mas não eram capazes de apoiar outra mulher e isso eu nunca vou aceitar. O mercado é para todos e acredito que iluminar o caminho de outra a sua luz aumenta ainda mais. Sempre digo: se você quer aumentar seu brilho próprio comece iluminando o caminho dos outros, a luz vem é a lei do retorno.
Sabrina Krug: Fortalecer a sororidade é essencial para que possamos crescer juntas, nos fortalecer no mercado e conquistar cada vez mais espaço. Quando nos apoiamos, não só impulsionamos umas às outras, como também elevamos o nível da sindicatura profissional, mostrando que competência e liderança feminina caminham lado a lado. Entretanto, percebo que, quando competitivas entre si, algumas mulheres podem adotar posturas agressivas, o que muitas vezes reflete um machismo estrutural enraizado. Por isso, a sororidade é essencial – ao invés de rivalidade, devemos buscar colaboração e reconhecimento mútuo. O que realmente faz a diferença na humanização e empatia dentro dos condomínios não é o gênero do gestor, mas a forma como ele conduz as relações, equilibra decisões e se posiciona com profissionalismo e respeito.
Bruna Caram: Quando as mulheres se unem, conseguem criar um ambiente de aprendizado e crescimento mútuo, tornando-se referências para novas profissionais e ajudando a transformar a gestão condominial em um espaço mais inclusivo, eficiente e inovador. O sucesso de uma mulher nunca deve ser visto como uma ameaça para outra, mas sim como inspiração e prova de que todas podem alcançar seus objetivos com determinação e apoio mútuo.
A trajetória desses profissionais prova que a liderança feminina não é uma tendência passageira, mas sim um novo padrão de excelência no mercado condominial.
Társia Quilião: “As mulheres estão construindo um novo mercado. E quem ainda duvida disso ficará para trás.”
Mauren Gonçalves: “As transformações nos condomínios passam pela profissionalização e, consequentemente, pela presença feminina.”
Sabrina Krug: “A liderança feminina incomoda porque representa mudança. Mas a mudança é necessária.”
Bruna Caram: Atuar no direito condominial me permitiu perceber o quanto os condomínios representam verdadeiras microcidades, com desafios de governança, regulamentação, convivência e segurança. O advogado que se especializa nessa área se torna uma peça fundamental para a harmonia e a eficiência da vida condominial, e essa responsabilidade foi um dos fatores que mais me motivaram a construir minha carreira com foco nesse nicho.
A mudança já aconteceu. E quem não aceitar essa nova realidade está resistindo ao progresso.
CONDOMÍNIOS FORTES SÃO CONSTRUÍDOS POR TODOS
A presença feminina na gestão condominial não é apenas um reflexo da evolução do mercado, mas uma necessidade real para a construção de condomínios mais organizados, eficientes e humanos. As respostas dessas cinco mulheres, acima, demonstram que, mais do que ocupar espaços antes negados a elas, estão redefinindo a forma de administrar patrimônios coletivos, trazendo técnica, empatia e inovação para um setor historicamente marcado por desafios de governança.
O mercado condominial precisa de gestores comprometidos, qualificados e preparados para lidar com os desafios cotidianos. Essa profissionalização não pode — e não deve — estar restrita a um grupo específico de pessoas ou a um monopólio de interesses. O fortalecimento dos condomínios deve ser um esforço conjunto da sociedade, e isso inclui mulheres, síndicos, administradoras, advogados e engenheiros que realmente compreendem a importância da valorização patrimonial e da boa convivência comunitária.
As experiências compartilhadas por Társia Smeha Quilião, Sabrina Krug, Mauren Regina Amaral Gonçalves, Letícia Andreolli Dias e Bruna Caram demonstram que competência, técnica e liderança não têm gênero. A mudança do mercado condominial começa com um olhar sensível não só feminino, mas de toda a sociedade, reconhecendo que a valorização dos patrimônios coletivos vai muito além da concentração de mercado em nome de uns ou de outros, mas sim do benefício de todos.
“Sim, podemos construir condomínios fortes. Mas isso só será possível quando o mercado entender que não há mais espaço para resistências ultrapassadas e que a profissionalização do setor passa, inevitavelmente, pelo reconhecimento da competência de cada indivíduo, independentemente de gênero. O futuro da gestão condominial não é masculino ou feminino. O futuro da gestão condominial é profissional” – finaliza a advogada Tatiana Lima
Tatiana Lima Advogado condominialista, pós graduado em gestão e direito condominial, direito trabalhista e direito imobiliário, gerente do empreendimento Condomínio Americas Avenue Business Square, apresentador de podcast “Happy Hour do Síndico” e “Americas Avenue Podcast” conselheiro da OAB 60ªsubseção
Társia Smeha Quilião Advogada (OAB SC 25376A | OAB RS 57343) da área condominial e prestadora de consultoria na área para diversos condomínios, formada em Direito (Universidade Luterana do Brasil – 2002); Pós-graduada em Direito Ambiental (UFRGS – 2004); MBA Gestão de Negócios (CESUSC – 2010);
Sabrina Krug Síndica profissional e consultora, atuando em 9 cidades nos estados do RS, SC e PR. Certificada 5 estrelas e vice-presidente da Assosíndicos RS.
Mauren Regina Amaral Gonçalves Experiência em gestão de condomínios há 38 anos. Empresária do segmento condominial, como Síndica Profissional, CEO do Papo Condominial RS, Fundadora benemérita e Presidente da AssosíndicosRS, Diretora Nacional Adjunta da Sindicatura pela Anacon.
Letícia Andreolli Dias Mestre em engenharia civil e especialista em engenharia diagnóstica.
Bruna Caram Advogada há 16 anos, com vivência e imersão total na advocacia, atuante em âmbito nacional em direito privado. Escritora e Palestrante sobre direito condominial e imobiliário, publicou o Livro “27 Estratégias para Síndicos de Sucesso” (2023)