Dia do Síndico: o que há para comemorar?
Maior profissionalização, deficiência na formação, grandes desafios, inclusive nas relações humanas. Tudo faz parte da vida de quem atua na gestão condominial, área em crescimento
Ana Rosa Tarsitano
Em 30 de novembro se comemora o Dia do Síndico. Sem dúvidas, essa é uma profissão em alta, caminhando cada vez mais para a profissionalização, mas que enfrenta uma enorme quantidade de desafios e problemas, inclusive agressões. Afinal, o que há para se comemorar nessa data? E para reivindicar? Quais os desafios desses profissionais, as carências e principais necessidades na atualidade? Do que dispõem, hoje, em termos de formação, capacitação, ferramentas de apoio e reconhecimento? Quais histórias e experiências ilustram a rica vivência dos síndicos não somente como gestores, mas em sua relação direta com os indivíduos?
Psicóloga e coach, Ana Rosa Tarsitano atua da área de gestão há 23 anos. Professora da Abadi e proprietária da empresa Tarsitano’s Consultoria e Gestão, ela conversou com a Revista dos Condomínios sobre o significado desta data, e se ela realmente merece ser festiva. “Fato é que essa não é uma profissão fácil. Mas, com Inteligência emocional, empreendedorismo e, principalmente, perseverança, conseguimos evoluir a nível profissional e, consequentemente, financeiro. No entanto, algo que realmente nos motiva a continuar nos empenhando cada vez mais é o feedback dos nossos clientes, que não apenas confiam em nosso profissionalismo, como nos incentivam a melhorar cada dia mais. Temos problemas? Com certeza! Mas podemos utilizá-los como aprendizado e evolução”, pontua.
Ela lembra do início de sua trajetória profissional. “Tive muita sorte por iniciar profissionalmente no meio condominial em uma administradora de São Paulo com perfil Facilities. Minha primeira função foi como Assistente de Concierge em um Condomínio Clube, na Barra da Tijuca. Os condomínios com perfil Facilities podem proporcionar serviços cotidianos como portaria, limpeza e segurança até serviços mais complexos com amplas grades de aulas de academia, spa, restaurantes, salão de beleza, aulas de tênis, eventos sociais internos e externos, conciergeria, courrier, entre outros”, inicia, para prosseguir.
“Minha imensa sorte ocorreu no primeiro dia de trabalho, quando estava fazendo vistoria nas áreas comuns, especificamente na academia do bloco pelo qual era responsável, e me deparei com uma condômina caminhando em minha direção com roupa de ginástica e cabelos vermelhos esvoaçantes. Ao chegar próxima, começou a falar de forma exaltada, me chamando de incompetente, entre outros adjetivos dispensáveis em serem compartilhados. No meio de seu discurso, entendi que ela estava se referindo ao fato de uma esteira estar com defeito há bastante tempo e eu, supostamente, seria a pessoa que não providenciara o reparo – lembrando que estava no meu primeiro dia ali. Respirei fundo e pensei: tenho aqui duas oportunidades. Gritar com essa ‘louca’ de volta, esclarecendo que eu não poderia ser julgada como incompetente logo em meu primeiro dia, e em seguida virar as costas e nunca mais pensar em trabalhar em um condomínio… Ou ficar e provar a ela o quanto eu era competente. Optei pela segunda alternativa, e passei a ‘respirar’ aquele condomínio. Eu me aprofundava em todos os assuntos, desde operacionais, acompanhando o funcionamento dos sistemas, até financeiros, administrativos, legais e de relacionamento”, recorda.
Ana Rosa Tarsitano conta que, em pouco tempo, conseguiu mudar diversas questões que causavam insatisfação aos condôminos, tinha uma equipe composta por recepção, portaria, segurança, jardinagem, limpeza, manutenção, guardião de piscina e professores de atividades físicas, totalmente treinados e informados sobre absolutamente tudo o que acontecia no cotidiano. “Nosso cuidado era tão extremo que ligávamos para os moradores nos dias de seus aniversários e, em nome de toda a equipe, desejávamos felicitações. A consequência de minha dedicação, de ter hora para assumir o trabalho, mas não ter hora para sair, foi ser convocada para uma reunião de conselho seis meses depois de contratada e ser promovida, passando a minha remuneração ao dobro do que recebia anteriormente. Detalhe: um dos conselheiros era esposo da senhora que me abordou na academia em meu primeiro dia de trabalho”, diverte-se ao lembrar.
“No decorrer de minha carreira, já passei por diversos empreendimentos, cada vez mais complexos, até que fui contratada para implantar um setor de Gestão Condominial em uma administradora do Rio de Janeiro, na qual presto serviços até hoje, além de desenvolver minha empresa Tarsitano´s Consultoria e Gestão Condominial. Com relação à minha sorte inicialmente relatada, refere-se ao fato de que todo o aprendizado e rotina de estudos que desenvolvi naquela época contribuíram para que implantasse e ministrasse até hoje, ao lado de grandes profissionais reconhecidos da área, o curso de capacitação de gestores condominiais na Abadi. Nesse curso, já formamos algumas dezenas de profissionais que foram munidos de amplos conhecimentos, necessários para enfrentar os desafios dessa área. Tenho contato com a maioria dos meus alunos e sinto muito orgulho em acompanhar seus desenvolvimentos”, emociona-se.
Especialização é importante para síndicos
Para Ana Rosa, a especialização é importante pela ampliação de Condomínios Clube, devido à necessidade de estudo e conhecimento de aspectos legais que envolvem todas as atividades desenvolvidas nos condomínios, além das obrigatoriedades comuns a esse tipo de moradia. Há muitos anos eram cumpridos basicamente a Convenção e Código Civil, o que garantia aos síndicos condôminos a possibilidade de gerir os condomínios sem maiores problemas. Com o desenvolvimento de condomínios com perfil Clube, as legislações foram sendo alteradas, com o objetivo de garantir a integridade e segurança dos condôminos, o que exige conhecimento dos atuais síndicos, para que os próprios estejam resguardados contra possíveis questionamentos legais e sanções.
“Portanto, um dos desafios para aqueles que estão ingressando no meio condominial como síndicos ou gestores condominiais é ter uma rotina de estudo, se atualizando constantemente sobre as mudanças no âmbito legal no que tange aos condomínios. Além disso, tendo em vista que o contrato de síndico tem vigência de um a dois anos, de acordo com a convenção, é importante que o profissional tenha estruturado um processo organizacional visando às melhores práticas de gestão, com foco em resultados eficazes que, como consequência natural, garantirão a sua reeleição”, pondera.
Outra questão importante, destaca Ana Rosa Tarsitano, é o primeiro contato com o ‘cliente’. Isso porque nenhum condomínio desenvolve o interesse em alterar o síndico ou gestor condominial quando os resultados apresentados por eles são eficazes. Portanto, é essencial escutar as expectativas dos ‘clientes’ e desenvolver um modelo de gestão de acordo com aquelas vontades. Caso contrário, os condôminos permanecerão frustrados e desejarão nova mudança de gestor. “Uma abordagem pessoal, dando atenção aos condôminos, propicia o início de um relacionamento que pode se firmar ao longo do tempo. Já fechei contratos com condomínios após participar de 13 reuniões, dentre elas duas assembleias. Estamos nesse condomínio desde 2018, com satisfação da maioria dos condôminos”, comemora.
Nossa especialista conclui afirmando que é importante, no decorrer do tempo de dedicação aos condomínios, manter-se sempre com uma postura ética e profissional, com o máximo de transparência possível. Isso é o que garante um vínculo de confiança, aberto ao diálogo, contribuição e apoio. A consequência é não somente a renovação do contrato, mas a indicação de seus serviços a outros condomínios. E, nessa área, assim como nas demais, o networking é fundamental para garantir o seu progresso enquanto profissional. “Feliz Dia do Síndico a
todos que se dedicam incansavelmente para que essa profissão seja reconhecida e respeitada, em especial para aqueles que precisaram aprender a manter o equilíbrio emocional e a lidar com as adversidades e, apesar de todos os problemas, perseveram a cada dia”, parabeniza Ana Rosa Tarsitano.
Adenilton Silva Moreno
Necessidade de ajustes na formação
Adenilton Silva Moreno é sócio-administrador da empresa Universal Sindicância, com sede em Salvador/BA e dedicada à gestão e administração da propriedade imobiliária. “A profissão de sindicância apresenta grandes desafios. E o pior de todos é ter que administrar problemas pessoais e de ‘politicagem’. Eles ocorrem pela ausência de conhecimento das normas, leis e procedimentos que condôminos sobre o Regimento e a Convenção. Mesmo quando têm interesse em conhecer as regras, alguns deles as desconsideram, pois buscam apenas obter favorecimento pessoal dentro de suas solicitações. Esses conflitos, em geral, têm início a partir de uma negativa administrativa pois, infelizmente, muitos condôminos não aceitam ser contrariados, mesmo em respeito às determinações legais”
Nosso segundo entrevistado relata que, em muitos casos, quando o condômino antissocial entende que suas solicitações em descumprimento às normas e procedimentos do condomínio não serão atendidas, têm início os assédios, verbalizados por e-mails, ameaças, publicações fakes e até mesmo agressões físicas. “Esses são fatos que, infelizmente, como síndico, venho enfrentando em minha gestão”
Adenilton lamenta que, nos últimos anos, muitas instituições sem preparo vêm ofertando cursos de sindicatura. Passam ilusões de ganhos financeiros e não apresentam os desafios e a extrema necessidade de capacitação que o profissional precisa obter antes de iniciar o exercício da função. “Essas instituições deixam de ratificar os problemas que a profissão traz consigo e que impactam até mesmo na saúde física e, principalmente, mental dos gestores. Costumam ainda ficar de fora questões relevantes, como as responsabilidades civil e criminal, a necessidade de domínio próprio e autocontrole para administrar conflitos em todos os cenários, problemas estruturais, judiciais, criminais”, enumera, para continuar sua análise.
“Farei aqui uma pequena analogia. Muitos alunos participam de cursos de formação para segurança de carro-forte, onde são apresentados os ganhos acima de outras categorias, Isso, é claro, chama a atenção de muitos. Contudo, quando o instrutor apresenta os vídeos e fotos dos agentes de carro-forte mortos e com seus corpos irreconhecíveis, cerca de 50% dos candidatos desistem da profissão. Essa realidade, também feita de dificuldades e desafios, é que as escolas preparatórias da sindicância também deveriam passar para seus alunos.”
Quanto ao setor, Adenilton diz ter certeza de que será uma área em expansão nos próximos anos. “Ela crescerá absurdamente. Porém, sem a capacitação adequada e com profissionais que não vendem o valor da profissão da forma correta, gerando assim a fragilidade na escolha de excelentes profissionais. Infelizmente, como já destaquei, o mercado em geral não oferta a capacitação adequada para a função. Ainda bem que existem poucas instituições boas. Mas, mesmo essas, ainda retêm parte das informações dentro dos problemas que o síndico enfrenta em seu cotidiano profissional. Apenas vendem a ideia da beleza do retorno financeiro”, lamenta.
Reconhecidamente, não é nada fácil ser síndico, estando pronto a receber e atender às demandas diversas dos moradores, com seus perfis singulares. Indispensável para o bom funcionamento das atividades inerentes ao cotidiano do condomínio, ele encara constantemente inúmeros desafios, como coordenar o setor administrativo, financeiro e de RH, além de fiscalizar os serviços de segurança e de manutenção prestados por terceiros – isso só para citar alguns. Felizmente, o mercado digital já apresentou diversos aplicativos e ferramentas capazes de auxiliar os síndicos na execução de suas tarefas. Bendita tecnologia. Bem, mas isso já é assunto para uma outra matéria…
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