Redução de custos: dá para baixar o valor das cotas?
Acredite: há meios para otimizar recursos sem prejudicar a segurança ou abrir mão de serviços em seu condomínio. Veja as dicas de nossos especialistas
Edvania Valim
Pode testar aí, é uma unanimidade. Todo condômino reclama do valor da chamada cota condominial, que julga alta. Há como fazer uma redução nesse valor? Combater a inadimplência é fator vital, e eventual redução pode ajudar também a reduzir a própria inadimplência. Onde cortar, sem que haja risco na segurança ou queda grave na qualidade das instalações e serviços? É possível não demitir colaboradores? Como gerir melhor os recursos? Quais pequenas economias cotidianas podem ser feitas e, uma vez somadas, resultar em queda efetiva do valor da cota? O que é, ao menos em teoria, uma cota de valor justo?
Edvania Valim, de São José dos Campos (SP), é uma síndica profissional 5 estrelas, com MBA em Gestão Empresarial pela FGV. “O síndico morador ou externo, em qualquer condomínio que esteja, tem o desafio de acalmar os ânimos dos condôminos que julgam alta as cotas condominiais… Mas, como fazer isso? Se realmente procedem tais descontentamentos, o síndico deve pedir à administradora o resumo de todas as despesas do último ano ou semestre, para analisá-las. Com todos os dados em mãos, se faz necessário saber quais são as com maior representatividade no total geral dos gastos mensais. Dica: separe as que representam 80% do valor da cota condominial para renegociá-las”, aconselha.
Segundo ela, geralmente os contratos terceirizados de segurança e zeladoria são os com maior percentual na soma das despesas. Assim, é necessário observar se o valor está conforme a média de mercado, se os serviços prestados estão satisfatórios (perguntar para os moradores ou fazer enquete, é uma dica), pedir CND´s (certidão negativa de débitos municipal, estadual, federal, trabalhista e judiciário), para checar como está a saúde financeira da empresa e pesquisar quantos clientes a empresa possui. Até para saber se, caso ela perca aquele condomínio, terá condições de remanejar os funcionários ou arcar com as rescisões.
“O prestador de serviços nos elevadores também precisa ser revisado e a quantidade de corretivas que foi feita no ano, bem como custo das peças, caso o contrato seja sem elas. Com essas informações, chame os prestadores ou outras opções idôneas e com referências para fazer a possível troca. Um alerta: não veja apenas o custo, pois o muito barato pode se tornar uma tremenda dor de cabeça. Analise os custos x benefícios, sempre”, complementa.
A possível demissão de colaboradores é sempre um grande dilema, diz a primeira entrevistada. “Os condomínios que já possuem funcionários terceirizados, geralmente, pedem que eles sejam aproveitados em outros postos ou verificam se há a possibilidade de flexibilizar a escala de trabalho, de forma a otimizar o serviço e não gerar horas extras. Pode ainda diminuir o tempo ocioso, se tiver muitos funcionários no local. Isso tudo para evitar a necessidade de redução do quadro de colaboradores. Mas, quando não há jeito, e as mudanças precisam ser mais efetivas, antes da demissão de funcionários orgânicos, por exemplo, é primordial verificar na convenção coletiva da categoria se há multas, para os condôminos não serem surpreendidos com gastos extras e, muito menos, com ações trabalhistas”.
Edvania defende que o síndico precisa ter uma previsão orçamentária factível, contemplando todas as despesas previstas para aquele ano e com margem para as urgências, e não esquecendo as possíveis inadimplências. Sempre revisando tudo. E se o total das receitas se tornar insuficiente para pagar as despesas, deve convocar assembleia para apresentar nova previsão orçamentária.
“Renegociados os 80% das despesas, é aberta margem também para os 20% restantes. Como tarifas bancárias, novos fornecedores de material de limpeza e de consumo, verificações de vazamentos e campanhas educativas para redução do consumo de água e instalação de fotovoltaicos e sensor de presença, para otimizar o uso energia nas áreas comuns. Pode ainda iniciar a venda de material reciclável coletado entre moradores, como latas de alumínio e óleo de cozinha – são alternativas de receita. Há alguns investimentos que poderão trazer, a longo e médio prazos, economias, como instalação de captação de água das chuvas, para limpeza de áreas externas, de painéis solares e ponto para recarga de veículos elétricos”.
Mas, afinal, o que é, ao menos em teoria, uma cota de valor justo? “O morador, quando vê o condomínio bem cuidado, quando se sente seguro onde mora, tendo várias opções de lazer, observa se o valor do aluguel e cota estão dentro do valor de mercado, e se o imóvel está valorizando. Assim, para ele está ótimo. Mas, para o síndico, a cota de valor justo é aquela que, depois de fazer todos os ajustes e renegociações, permite pagar as despesas e ainda fica um saldo para guardar para as eventuais melhorias. Enfim, essa questão é um desafio diário para o síndico pois, além de todas as responsabilidades legais que possui, ele precisa acompanhar de perto como está a percepção dos condôminos e moradores frente a sua gestão”.
Sérgio Gouveia
Uma prova de cálculos e, sobretudo, bom senso
Administrador de empresas, com MBA em finanças, Certificado em Gestão e Estratégia pela Fundação Dom Cabral. e professor certificado pela Universidade de Cambridge, Sérgio Gouveia sempre busca traduzir o complexo em algo simples que todo síndico possa entender e utilizar na sua gestão. É assim que ele também contribui para esta edição da Revista dos Condomínios.
“Que tal nos perguntarmos: o que define o valor da cota condominial? A receita total necessária para o condomínio arcar com todas as despesas ordinárias, devidamente cotizada entre os condôminos, geralmente pelo critério da fração ideal (Lei 4.591/64, Art. 12, § 1º). Assim, deve a s=cota ser capaz de garantir o pagamento de todas as manutenções, salários, fornecedores, concessionárias, que garantam o bom funcionamento, segurança e bem-estar de todos do condomínio. A pergunta de um milhão (ou mais…) é o que fazer para baixar essas despesas, sem deixar de fazer tudo que está previsto nas leis, normas, convenção, regimento interno?”, provoca ele.
“Em muitos condomínios, vivemos a ‘síndrome da lâmpada de LED’. Essa é clássica. Quando o tema ‘redução de custos’ surge na assembleia, sempre tem alguém dando essa sugestão brilhante (desculpe o trocadilho). Aconteceu em muitas das quais participei. Por isso, sempre levo essa conta feita antes. Ok, essas lâmpadas consomem menos, mas… Qual o impacto dessa mudança? Existem alguns sites que oferecem uma calculadora online para você comparar os consumos. Foi através de um deles que verifiquei que a ideia de trocar as lâmpadas fluorescentes por LED, no meu condomínio, teria um impacto de menos de 0,5% nas despesas, associado a um investimento na compra dessas lâmpadas, que não era prioridade naquele momento de caixa combalido… Ou seja, resultado nulo”, reconhece.
Segundo ele, é bem comum o síndico inexperiente tentar, com louvável boa vontade, resolver todos os problemas do condomínio, inclusive os custos altos. Daí, ele sai atirando para todos os lados. Isso é um misto de ingenuidade, despreparo e Mito de Sísifo, que fala sobre um personagem da mitologia grega considerado o mais inteligente e esperto dos mortais. Entretanto, ele desafiou e enganou os deuses e, por isso, recebeu um castigo terrível: rolar uma grande pedra montanha acima por toda a eternidade. Em resumo, foi condenado a passara vida exercendo uma tarefa cansativa e inútil. “Desculpe destruir seus sonhos: essa história de resolver tudo não vai rolar”, volta a provocar Sérgio Gouveia.
“A redução de custos, bem como praticamente qualquer coisa que realisticamente busque obter resultados, depende de um plano desenhado com critério e técnica para que se obtenha o máximo resultado com o menor dispêndio de energia e recursos possível, e num período mais curto. Um dos ensinamentos mais valiosos que passo no meu curso tem tudo a ver com redução de custos. O economista italiano Vilfredo Pareto, ainda no século XIX, definiu uma proporção que ficou famosa e é muito usada até os dias de hoje devido à sua simplicidade e precisão. Ele observou que, de maneira geral, 20% das causas geram 80% dos resultados. Por exemplo, 20% dos itens do seu portfólio respondem por 80% das suas vendas; ou 20% das fábricas produzem 80% da poluição. E por aí vai…”
Ou seja, se tem dez itens listados no plano de contas como despesas ordinárias, certamente dois deles geram em torno de 80% das despesas. “Duvidou, né? Pode ir lá olhar. Eu espero. Pronto, agora que você está convencido, vou fazer meu papel de vidente: provavelmente um desses itens está na rubrica de pessoal, certo? Os outros vão depender muito do modelo de funcionamento de cada condomínio. Esses dois ou três itens juntos devem dar bem próximo de 80% das despesas ordinárias totais do condomínio. Bem, se você identifica que nesses dois itens há 80% das despesas, então faz todo sentido você começar a buscar a redução por eles, concorda? O motivo é simples. Digamos que você tem um item que custa R$100 e outro que custa R$1 mil. Reduzir 10% de R$1.000 (= -R$100) é muito mais fácil e vantajoso do que reduzir 50% de R$100 (= -R$50). Vejam que finanças têm mais a ver com bom senso do que com cálculos complexos”, aponta.
E o resto dos itens? Aqui Sérgio diz que deve entrar em cena uma habilidade do bom gestor, que é ter foco naquilo que produz resultados. “Os demais itens têm importância sim, e se for possível lidar com eles sem desviar o foco dos itens que mais trarão resultados, então ok. Senão, eles vão ter que esperar a sua vez. Afinal, como disse antes, resolver todos os problemas ao longo de um mandato é impossível. Sempre haverá escassez de tempo, recursos, pessoal, e por essa metodologia você facilmente consegue definir o que é prioridade”, define ele, que segue com suas orientações.
Sem bala de prata ou pílula mágica
“Outra coisa que ensino aos meus alunos é a implementação de um plano diretor. Um projeto de médio/longo prazo, no qual as necessidades e os desejos dos condôminos estejam descritos em detalhes para que sejam colocados em prática ao longo de três a cinco anos. E é justamente nesse plano que alguns ingredientes importantes entram em cena. O primeiro é o próprio processo de pensar a longo prazo, em parceria com os condôminos. Como não existe bala de prata, nem pílula mágica, a efetiva redução de custos não virá de uma ou das medidas, e sim de um conjunto consistente e constante de ações adotadas de forma planejada. Ou seja, a metodologia de Pareto trará bons resultados e, em seguida, novos itens passarão a ser prioridade. Então, otimizamos esses novos itens, e depois deles mais outros, e seguimos assim, para sempre. Foi assim que mantive a cota aqui congelada por sete anos, fiz reformas das áreas comuns sem um centavo de taxa extra e, ao final, baixei os valores em 20%”, conta.
Outra máxima do entrevistado é: redução de custos não é destino, é caminho. “Digamos que você paga R$100 por algum produto ou serviço. Tem sido esse mesmo valor há anos. Você bate no peito, orgulhoso e diz: ‘há anos eu consigo manter esse preço, sem reajuste!’ Ok parabéns. Será mesmo? Vou fazer duas perguntas sobre isso: esse valor te entrega a qualidade adequada ao que o condomínio precisa, ou usa o critério do ‘mais baratinho’? Você tem certeza de que o menor valor possível é esse? Como sabe se o valor deveria ser R$70, mas há anos você paga R$100 e está aí se achando? Quando um processo é ineficiente, sai dinheiro pelo ralo todo dia. Um pouquinho aqui, outro ali… Todo dia. Mas é pouquinho, e você nem percebe. Ou pior, nem questiona. E aí, com o passar dos anos, vira muito”, alerta ele, que dá a solução para essa equação.
“Qual o remédio para isso? Questionar. Sempre. O tempo todo. Mudar de ‘óculos’ ao olhar para o seu condomínio. Desafiar o modelo. Perguntar-se: ‘essa é a melhor forma de fazer isso? Tem tecnologia mais eficiente e barata disponível para fazer isso? Tem alguém fazendo isso melhor do que nós? Por que fazemos assim? Esse é o melhor fornecedor?’. E por aí vai. Em administração temos uma máxima: aquilo que você não mede, você não gerencia. É simples assim. Portanto, sem previsão orçamentária não há qualquer parâmetro para saber se as contas estão sob controle ou fora dele. Se essa prática – aliás obrigatória e prevista nos Arts. 1.348 e 1.350 do Código Civil – já é amplamente negligenciada, lamentavelmente o acompanhamento orçamentário é quase inexistente em uma grande quantidade de condomínios”, lamenta Sérgio.
E são justamente esses dois fatores – previsão e acompanhamento orçamentário – que permitem ao síndico verificar se as contas estão sob controle, onde estão ocorrendo desvios dos valores orçados, ter insights sobre quais itens do plano de contas merecem mais atenção, dentre outros aspectos. “A mensagem que qu
ero deixar aqui é que a redução de custos se dá através de uma mudança de modelo de gestão, muito mais do que a mera troca de lâmpadas por LED, que a substituição da portaria orgânica pela remota, da implantação de energia solar. E isso passa pela capacitação e pela profissionalização do síndico. Invista em conhecimento. Esse, não reduza jamais!”, aconselha ele, treinador de professores certificado pela International House, ex-diretor de empresas, empreendedor e síndico morador há mais de 10 anos.
Cícero Sabino
Controle da inadimplência ajuda a reduzir a cota condominial
Cícero Sabino é formado em sindicância profissional desde 2018. Especialista em implantação de condomínio, já soma mais de 35 iniciativas no Rio de Janeiro. ao mesmo tempo em que está à frente da MNS. “Na verdade, controlar a inadimplência é fundamental para reduzir a cota condominial. Basicamente, a redução de custo do condomínio está em avaliar detalhadamente as despesas e verificar em que ponto é possível cortar gastos sem prejudicar o andamento do condomínio. O maior vilão da cota condominial é a conta de água, que precisa ser acompanhada de perto. Além disso, vale avaliar os contratos das empresas terceirizadas que presta serviço no condomínio e apostar nas empresas que façam mais de uma atividade, sendo possível negociar valores mais baixos. Planejamento é a palavra-chave: ele ajuda o administrador a reconhecer a necessidade, traçar metas e estruturar ações. Esse processo pode começar durante uma assembleia condominial por meio das sugestões e críticas dos condôminos”, acredita ele, que não abre mão mesmo das pequenas e tradicionais economias.
“Colocar um simples sensor de presença e lâmpadas led nos elevadores, corredores e garagem. Essa providência economiza. 60% com a conta de luz. ou colocar nas descargas sanitárias válvula de duas fases, com essa medida pode chegar a 50% de economia. Cabe ainda fazer uma cisterna de captação da água da chuva para reuso e, se possível, investir em energia solar. A coleta seletiva também gera um retorno em valor ao condomínio, que pode ser usado para compras de material de limpeza”, conclui.
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