Com grandes poderes vêm grandes crimes?

Homem que invade condomínios no meio da noite ganha apelido inusitado, segue dando trabalho às autoridades e levanta debate sobre segurança condominial

 
Samuel Pereira
José Paulo Pires
André Junqueira

Nem mesmo Stan Lee poderia imaginar que seu amado e carismático personagem, inspiração para tantos jovens ao redor do mundo, poderia estar sendo usado para descrever aquilo que tanto combateu durante centenas de edições de quadrinhos, séries animadas e filmes: o Homem-Aranha, mas nesse caso às avessas.

Recentemente, na Zona Norte do Rio de Janeiro, mais especificamente nos bairros de Vila Isabel, Andaraí e Grajaú, a polícia luta para tentar identificar o homem que está causando apreensão em moradores da região. Mostrando uma habilidade inusitada, ele escala prédios, invade apartamentos entrando pelas janelas ou entradas das varandas e, como dizem as vítimas, “faz a limpa”. Diversos condomínios já relataram perdas de bens valiosos como joias e eletrônicos, e de acordo com a 20º DP (Vila Isabel), esse prejuízo passou dos R$ 20 mil.

O trabalho não está fácil, e a polícia ainda também averigua se o suspeito opera sozinho ou faz parte de uma quadrilha. Afinal, mais de 20 residências já foram invadidas no espaço de um mês e meio, e o que chama mais atenção é que criminosos com atitudes parecidas podem ser identificados em todo o país. Assim, “Homem-Aranha” virou a definição padrão para aqueles que mostram grande capacidade de escalada. Lembramos que, cerca de quatro anos atrás, também na Zona Norte do Rio, a polícia conseguiu prender o “Homem-Aranha do Méier” e, no Itaim Bibi, em São Paulo, quatro prédios foram escalados e nove apartamentos foram furtados.

Por isso, a REVISTA DOS CONDOMÍNIOS buscou respostas e uma perspectiva especializada. Conversamos com três especialistas renomados no meio da segurança para que, ao menos, as chances de alguém repetir os atos desse homem sejam menores. Nosso painel de entrevistados contou com Samuel Pereira, administrador de empresas de segurança privada, diretor da Haganá e membro durante cinco anos da PM-SP protegendo o Palácio do Governo, André Luiz Junqueira, professor e advogado com mais de 17 anos de experiência no mercado, do Coelho, Junqueira e Roque Advogados Associados, e com o delegado da Divisão de Capturas e Polícia Interestadual, José Paulo Pires.

Samuel nos informa, primeiramente, que é preciso ter noção das áreas que dividem o condomínio. Elas são quatro:

  1. Área de invasão: perímetro que separa o condomínio da rua ou da outra propriedade;
  2. Área de controle: são os pátios, ou espaços internos do condomínio os quais estão entre os muros e a própria edificação;
  3. Área de perigo: acesso direto a edificação que permite ao invasor ter acesso aos andares dos apartamentos (são as portas e janelas dos halls);
  4. Área crítica: acesso a pedestres e veículos.

Em relação ao invasor que vem causando muitas dores de cabeça, o especialista faz sua análise. “No caso em questão, recomendamos que o síndico reavalie o sistema de proteção perimetral, sendo que a primeira proteção precisa possuir barreiras físicas e sistemas de proteção eletrônicos eficazes, ou seja, além dos muros ou grades, ter sensores de presença, cercas monitoradas, câmeras e a integração desses sistemas, de forma que, ao haver uma tentativa de intrusão, o sistema gere a informação ao porteiro (se possível concomitantemente para uma central de monitoramento externa), onde mostrará em tempo real o que, de fato, está ocorrendo. Assim, o sistema alertará o porteiro, independentemente de estar executando outras atividades, para olhar o que está ocorrendo e adotar as medidas cabíveis”, informa.

Planejamento de segurança

Por sua vez, José Paulo Pires, usando toda sua experiência, vai além. O entrevistado falou de algo que muitos inseridos na esfera condominial podem nem saber do que se trata. Estamos falando do “plano de segurança” elaborado por uma comissão de segurança. Para o especialista em segurança, esse planejamento deve conter seis itens e ser acompanhado por um profissional capacitado para que os fatores de risco possam ser avaliados e as ideias saiam do papel.

  1. Análise de risco (perímetro, comunidades, vias com incidências criminais etc);
  2. Segurança física (portões, cercas etc);
  3. Segurança eletrônica (câmeras, cercas eletrônicas etc);
  4. Procedimentos (normas que devem ser seguidas por funcionários, moradores, empresas etc);
  5. Qualificação/Treinamento (cursos, palestras etc);
  6. Custos (avaliação da receita e despesa com os sistemas).

Essas são algumas das medidas que síndicos e gestores podem tomar para que seus condomínios fiquem, de fato, mais seguros. Contudo, é possível que o representante máximo do edifício esteja indo um pouco além do que é visto como “normal”? Teria um limite para todo o investimento?

Samuel e Paulo, todavia, apontam pontos diferentes. O diretor da empresa Haganá comenta que, sim, existe um fim para todos os recursos que podem ser investidos, porque, segundo ele, gastos exagerados que não se traduzem em segurança concreta acabam piorando a qualidade de vida dos condôminos, e que é preciso contar com parceiros (empresas de consultoria) que sejam capazes de oferecer aquilo que realmente é almejado de acordo com as melhores práticas mercadológicas.

Já o delegado José Paulo Pires, que foi responsável por anos pela segurança do município de Niterói, comenta que não pode haver “paranoias”, afinal, o estado em que se encontra o Rio de Janeiro não permite que os condomínios renunciem a todo item que poderá aumentar a segurança dos moradores.

Quem também precisa entender sua parte nesse esforço coletiva é o condômino. O advogado André Luiz Junqueira, figura renomada no cenário condominial, opinou a respeito de como os moradores podem auxiliar nesse processo. “Os condôminos devem agir em harmonia com o síndico. Algumas medidas de segurança competem ao condomínio, como instalação de câmeras de segurança em área comum, mas é o próprio condômino que evita falhas de segurança, não deixando portas abertas, seja da sua unidade ou do condomínio, toma cuidado ao autorizar pessoas estranhas ao condomínio etc”, comenta.

O advogado aborda ainda outras formas de se lidar com possíveis invasores. Segundo ele, o fato de contar com uma portaria 24h pode ser um bom inibidor de atividades criminosas, pois apenas a presença de alguém naquele local pode ajudar. Além disso, Junqueira comenta como os moradores podem ajudar na tomada de decisões das políticas públicas a partir do momento em que vão até as delegacias relatar os ocorridos.

“Cada registro de ocorrência contribui para que os órgãos de segurança pública possam direcionar melhor seus esforços para determinadas localidades e, em outra esfera, permite que os governantes coordenem melhor políticas públicas de combate à criminalidade”, finaliza.

Contatos

Samuel Pereira

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José Paulo Pires

@delegadojosepaulopires

André Junqueira

@andreluizjunqueira

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