Legislação protege os síndicos e prevê indenização por danos morais

Muitas vezes, no cotidiano condominial, eles são agredidos verbalmente e acusados injustamente, sem provas. Mas há formas legais de reagir. E se proteger

 
DIEGO BASSI

Por verificar abuso de direito, a 30ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP reformou, em abril deste ano, sentença de primeira instância e condenou um condomínio a indenizar um ex-síndico por imputações falsas feitas em uma ação de prestação de contas. A reparação por danos morais foi arbitrada em R$ 5 mil. Na inicial da ação, o condomínio acusou o antigo gestor de uma série de condutas irregulares, tais como uso indevido de receitas auferidas, aplicação de multas descabidas, recolhimentos fiscais indevidos, contratação de serviços por preços excessivos, entre outras. Além de não terem sido comprovadas, elas repercutiram negativamente em sua imagem. Com isso, pediu indenização por danos morais, negada em primeira instância. Mas o recurso foi acolhido, por unanimidade. Afinal, quais direitos assistem ao síndico que se sentir prejudicado diante de acusações falsas?

“O condomínio edilício consagrado na Lei nº 4591/64 e no Capítulo próprio do Código Civil, dos artigos 1331 a 1358, em ambas as leis, teve destacada a figura obrigatória do síndico, que é o representante legal do condomínio, cujos deveres estão descritos no artigo 1348 do mesmo código, tendo o dever de anualmente, e sempre que solicitado pelos condôminos, prestar conta dos seus atos. Em resumo, o síndico é a figura mais falada e lembrada no condomínio. Tudo é culpa do síndico…”, brinca e provoca Diego Bassi, advogado condominialista de São Paulo, para lembrar que este profissional até já virou personagem de letras de músicas, como a irresistível W Brasil, de Jorge Benjor, na qual Tim Maia foi alçado ao cargo.

O entrevistado pontua que, apesar de o condomínio edilício não ter personalidade jurídica, pois não é uma sociedade empresária ou fundação, sendo tão somente uma reunião de proprietários, ele promove atos de contratação, inclusive de funcionários. Logo, deve ter alguém centralizando esses atos, que são realizados pelo síndico. Sua figura difere daquela do zelador e gerente condominial, que são prestadores de serviço e atendem aos comandos do síndico. Assim como se diferem os atos de representação do síndico da organização contábil financeira da administradora, que pode ser considerada um braço da gestão.

As suas atribuições legais são diversas: representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns; dar imediato conhecimento à assembleia da existência de procedimento judicial ou administrativo, de interesse do condomínio; cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia; diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores; elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano; cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas; prestar contas à assembleia, anualmente e quando exigidas; realizar o seguro da edificação, além de convocar a assembleia de condôminos.

“Por conta dessa concentração de deveres e responsabilidades na figura do síndico, é correto afirmar que ele acaba sendo alvo dos condôminos, que atribuem culpa por todas as situações ligadas a estrutura condominial, seja no tocante à infraestrutura do empreendimento, seja nas questões de relacionamento. Choveu e alagou o estacionamento? A culpa é do síndico! Cano do 20º andar estourou por conta da pressão da água? A culpa é do síndico. O vizinho de cima anda de salto no apartamento e faz barulho? Adivinhe de quem é a culpa? E ainda vivenciamos o império da gestão paralela dos grupos em mídias sociais, em especial o WhatsApp. Se antes o síndico era alvo de críticas, hoje ele é alvo de perseguição. De mensagens agressivas, que vão muito além da mera critica ou sugestão”, revela Diego Bassi.

Em geral, é nesses grupos extraoficiais que se perde o controle quanto ao que é apontado, havendo cobranças que vão além da crítica. Há o abuso em relação ao horário, por exemplo, pois os condôminos passam a cobrar toda e qualquer situação nessas redes, deixando o síndico refém 24 horas por dia dos comandos da rede social. Muitos que não têm coragem de se expor na assembleia, às vezes por falta de tempo, por preguiça, e alguns por covardia, fazem vasto uso da rede social e ali escrevem comentários sem parcimônia, alguns ofensivos. Fato que as mídias digitais revolucionaram nosso modo de comunicação, estão agregadas ao dia a dia condominial e, nesse momento, quem vivencia esse cotidiano busca depurar esse meio de comunicação.

“O alvo preferencial é a prestação de contas, sendo que, na maioria dos casos, as críticas são dúvidas que podem ser facilmente sanadas. Mas, nas redes sociais, quando um reclama, acaba causando efeito manada. Logo, os comentários ganham likes, views, outros tantos comentários e uma simples dúvida pode virar uma grave acusação. Um exemplo clássico é a leitura individual da água. Quando o condomínio adota o sistema, alguns condôminos que não têm noção de sua unidade, quando percebem o tamanho do consumo e o valor da conta individual, outrora socializada, vão à rede social, denunciar o síndico, a empresa que faz a leitura, a administradora. Pronto! Os que estão na mesma situação fazem coro e o caos está instalado”, conta.

Síndico encontra amparo na lei do Stalking

Diante desse quadro, há alguma lei que pode ser aplicada aos moradores e condôminos que, porventura, abusem e ofendam os gestores, em especial, fazendo uso dessas ferramentas? Nosso especialista garante que sim. “Da mesma forma que as gestões vão se tornando cada vez mais profissionais e tecnológicas e a legislação vai ampliando as responsabilidades dos síndicos – vide a Lei de Violência Doméstica e contra animais, obrigando-o a denunciar – é permitido ao síndico buscar amparo judicial. Há, por exemplo, a famosa lei do Stalking – Lei nº 14.132/21, que trata da perseguição. Há ainda possibilidade de o síndico denunciar à autoridade policial os crimes de calúnia, injúria e difamação – previstos nos Artigos 138, 139 e 140 do Código Penal”, aponta.

Diego Bassi lembra que a melhor pena é a pecuniária, aquela que, como se costuma dizer, “dói no bolso” do infrator. O gestor pode requerer indenização na esfera civil, dano moral (por conta da imagem) e material quando perde outros negócios, como concorrências, por exemplo, por conta das mensagens, que reverberam de um condomínio para outro, o que é comum no mercado condominial. “Em tempos sombrios, onde a violência contra o síndico e zeladores ganhou as manchetes dos jornais, reportagens televisivas e vídeos virais, todo cuidado é pouco”, alerta ele.

“O síndico deve reconhecer que, hoje, as pessoas têm maior acesso às informações, que circulam com maior rapidez. Dessa forma, um gestor eficiente e que busque a pacificação de conflitos deve ter como meta refinar a comunicação de seus atos. O síndico deve fazer uso das enquetes eletrônicas, chamando a massa para participar de eventuais decisões, e ampliar a realização de assembleias, que são o foro adequado para discussões e para que o condômino dê vazão a eventual insatisfação, dando ao gestor a possibilidade de esclarecer e minimizar o desconforto. Outra ferramenta positiva é a auditoria independente. Muitas e boas empresas prestam o serviço de auditoria contábil das contas, apontando previamente e preventivamente inconsistências, evitando maledicências e eventuais desvios”.

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