Respeito para manter o bom comportamento geral no período eleitoral

Rivalidades políticas, e até mesmo a torcida entusiasmada pela seleção brasileira na Copa do Mundo, não podem descambar para conflitos e agressões entre vizinhos

 
VANDER ANDRADE

Brigas entre parentes. Amigos que não se falam mais. O clima de radicalização política, sobretudo entre os eleitores de Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, que lideram as pesquisas eleitorais, abalou amizades e relações familiares. Com a proximidade da eleição para presidente, o tema chega também aos condomínios. O que pode ou não? Colar adesivos nas janelas? Pendurar bandeiras nas varandas? Casos de conflitos entre vizinhos por motivações políticas: intimidação em áreas comuns, gritos nas janelas em defesa de um ou outro candidato, xingamentos, agressões verbais e até físicas. Vem aí também a Copa do Mundo: nesse contexto, o condômino pode decorar sua unidade? Como o síndico deve agir em cada uma dessas situações? O que pode e deve fazer, sobretudo, na mediação de conflitos?

“Com a proximidade das eleições, candidatos a provimento de cargos eletivos oficiais, concorrentes entre si, tendem a acirrar os ânimos e intensificar ataques verbais, tanto na mídia tradicional como no âmbito das redes sociais. Nesse ambiente polarizado, muitos condôminos e moradores tornam- -se passíveis de ‘adotar um lado’, optando por realizar uma ação política que, a despeito de ser legítima e democrática, por arrastamento, em tempos de campanhas eleitorais agressivas e extremadas, podem vir a ser igualmente conflituosas”, avalia Vander Andrade, advogado, mestre e doutor em Direito pela PUC-SP.

Pró-reitor do Centro Universitário Fundação Santo André, nosso entrevistado defende que, nesse momento, em caráter preventivo e cautelar, impõe-se aos gestores condominiais lembrar aos membros da coletividade, através de comunicados escritos e visuais, sobre a necessidade de serem seguidos, de forma contínua e criteriosa, os preceitos associados às regras da boa vizinhança. Princípios que devem ser demarcados e denotados pelo respeito para com a convivência e a manutenção da harmonia na vida condominial.

“Brigas e contendas, se manifestas nas áreas comuns, em violação aos comandos normativos emanados das regras regentes do condomínio, devem ser submetidas ao crivo do poder disciplinar do síndico, analisando-se, caso a caso, a possibilidade de aplicação de sanções, tais como advertências ou multas, que estejam previstas na convenção ou no regimento interno”, explica.

Passando para o item decoração, nosso especialista fala ainda sobre o uso de adesivos nas janelas das unidades. “Para essa hipótese, recomenda-se analisar as particularidades e especificidades de cada condomínio sobre determinados aspectos como a integridade e a uniformidade da fachada do edifício, que devem ser sempre preservadas. Assim é que, em casos singulares, poderá ser autorizada a colocação de adesivos nas janelas das unidades autônomas, especialmente se estes não se apresentam visíveis em sua parte exterior. O mesmo não poderá ocorrer se tais imagens se demonstrarem perceptíveis, aptas, portanto, a deformar o aspecto visual da fachada.”

Mas, e na hora de torcer pelo Brasil? “Já as bandeiras que ostentam os símbolos nacionais, a nosso ver, devem ser admitidas, dentro dos parâmetros de razoabilidade, ou seja, desde que não representem risco de dano ou invadam a privacidade alheia. Isso porque o uso de bandeiras nacionais, conquanto mormente vedado pelas normas condominiais, em situações muito particulares, nas edições da Copa do Mundo de Futebol, resultam da manifestação expressa de um intenso sentimento de nacionalidade e de patriotismo que, a nosso ver, não somente não deve ser coibido, como ainda deve ser respeitado.”

Vander finaliza lembrando que o Direito não se resume aos textos legais e convencionais, mas compreende, dentro de sua moldura, o costume jurídico. Esse direito costumeiro recomenda, para ocasiões especiais, a flexibilização de regras normalmente plasmadas pelo ortodoxo dogma jurídico. “Para efeito comparativo, basta que nos lembremos da época própria às festas natalinas, em que se manifesta ostensivo o costume de ornar as fachadas de edifícios com lindas decorações, o que traz um espírito de fraternidade e de harmonia mais intenso, tanto dentro como até mesmo fora da coletividade condominial”, conclui.

VERÔNICA LINS

Peculiaridades do relacionamento humano

“O ser humano está em constante evolução, através da única ferramenta, que é o relacionamento. Como ser social, necessita viver em grupos. E a convivência é um exercício constante, pois a necessidade de pertencer ao grupo vem desde os primórdios, quando precisava se agrupar até para sobreviver. Isso está impregnado nas moléculas e é assim até os dias de hoje. E, justamente por lealdade ao seu grupo, surge o conflito. A polarização é a forma com que os grupos mantêm contato. O conflito aproxima, e a paz separa. No condomínio, assim como na vida, há de se adotar posturas que não violem a segurança, a saúde e o sossego. Colocar adesivo na janela, pendurar bandeira na varanda do apartamento, são formas de o condômino se expressar. Sendo, geralmente, uma conduta passageira permitida”, afirma Verônica Lins.

Advogada formada pela Universidade Federal da Bahia, com diversas pós-graduações já concluídas e ainda em curso, e focada na prevenção e solução de conflitos, ela segue em sua análise. “Sobre os conflitos por motivação política: a intimidação em áreas comuns, os gritos nas janelas em defesa de um ou outro candidato, as agressões verbais e até físicas devem ser coibidos com muita energia pelo gestor do condomínio. Afinal, pequenas concessões abrem espaço para grandes agressões e graves situações. E os síndicos podem ser responsabilizados civil e criminalmente, a depender da forma como atuarem”, descreve ela, também membro da Comissão de Direito Condominial da OAB/Bahia e diretora adjunta da Anacon/Bahia.

Segundo Verônica Lins, tratar do comportamento na Copa do Mundo é bem mais fácil, pois, em regra, não há conflito, uma vez que todos, a princípio, torcem pela seleção brasileira. Nesse caso, vale aproveitar a oportunidade para unir e pacificar os condôminos. O condomínio decorado de forma discreta, sustentável e econômica pode promover o encontro das famílias para assistirem aos jogos reunidas.

“O síndico deve sempre agir a serviço do bem do condomínio. Para isso, deve contar e explorar bem a assessoria jurídica especializada e experiente para nortear como se portar na prática, de acordo com o ordenamento jurídico. Outra ferramenta importante é a assessoria administrativa, também especializada e experiente. Afinal, o condomínio não é pessoa física e não é pessoa jurídica. É um ente diferenciado e deve ser tratado de forma diferenciada. Até porque, depois da família, ele é o núcleo onde o ser humano mais tem relacionamentos e, consequentemente, oportunidades para evolução.”

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Verônica Lins

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Vander Andrade

@vanderfdeandrade

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