A proibição de isenção dos encargos da dívida condominial

Com o aumento da inadimplência em muitos condomínios devido à crise econômica e a pandemia do Covid-19, muitos síndicos buscam de forma amigável a negociação direta com condôminos em atraso com a cota condominial.

Porém, na negociação o síndico pode conceder descontos dos juros, multa e correção monetária?

O artigo 1336, § 1º do Código Civil prevê que o condômino que não paga a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou não, sendo previstos os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito. Portanto, a maioria das convenções dos condomínios do Brasil afora, a penalidade em decorrência do atraso no pagamento da cota está expressamente prevista. Com esta fundamentação, o síndico não possui autonomia, por si só, de conceder isenção destes encargos, sendo necessária a deliberação na assembleia dos condôminos. Essa limitação e engessamento do síndico muitas vezes inviabiliza uma rápida negociação de casos mais complexos e que envolvem somas consideráveis que teriam impacto positivo no caixa, muitas vezes deficitárias dos condomínios.

Imaginemos um imóvel com débito elevado e acumulado de cotas condominiais e que o processo judicial de cobrança está com andamento, entretanto, prejudicado por falta de localização dos herdeiros do proprietário falecido. Eis que surge uma proposta de quitação do débito acumulado de um interessado comprador com desconto de 10% sobre o montante da dívida, para pagamento imediato e à vista.

O síndico do condomínio decide convocar uma assembleia para deliberar o tema, porém, considerando os prazos de convocação, a definição do tema ocorrerá apenas em 10 dias. Em virtude da demora na definição da proposta, o interessado desiste da compra do imóvel. Nesta situação, agiu corretamente o síndico, porém, o resultado prático não foi benéfico para o condomínio. Uma vez que aquela recuperação traria um “respiro” no orçamento.
Diante deste cenário, objetivando a concretização da operação e o recebimento do crédito em atraso, o síndico poderia ter realizado uma consulta ao conselho fiscal e/ou consultivo. E assim obtendo um sinal verde para finalizar a negociação para quitação com o interessado pela unidade, trazendo para o caixa do condomínio importante soma de valores. Apesar da justa motivação e anuência do conselho, o síndico ainda assim estaria em risco. Pois em eventual momento da sua prestação de contas e/ou deliberação posterior sobre essa concessão de desconto, poderá ocorrer a recusa dos demais condôminos, tornando a sua decisão objeto de questionamentos.
O mais indicado seria atribuir ao síndico, antecipadamente, em assembleia, autorização e alçada mínima para os casos de dívida da cota condominial mais complexos do condomínio. Criando, dessa forma, efetivo respaldo e segurança para a decisão do mesmo. Porém, como tudo em condomínio não funciona de forma tão simples, haverá aqueles moradores com a opinião de que não se deve conceder abatimento em dívida condominial. E que a recuperação, após recebida, deverá ser ressarcida, proporcionalmente, para cada unidade adimplente que suportou o atraso ao longo do tempo. Enfim, o síndico que lute!

Raphael Gama da Luz é gerente jurídico da Estasa Soluções imobiliárias, sócio titular do escritório RGLUZ Advogados, especialista em Direito Imobiliário, Direito do Consumidor e Direito Condominial.

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