O novo perfil do síndico, cada vez mais profissional

Xisto Mattos, autor de livro recém-lançado que fala dos novos desafios apresentados aos gestores condominiais, dá dicas importantes para esses profissionais

 
Xisto Mattos

Quais os segredos de um bom síndico? Como desempenhar bem esse papel, reduzindo conflitos e zelando pelo bem-estar dos moradores de um condomínio? Para ajudar quem ocupa esta função a se tornar um bom gestor, o advogado Xisto Mattos, há mais de duas décadas atuando como síndico, acaba de lançar ‘Condomínio Edilício – Um estilo de Moradia’, pela Editora Lux. Desafios do cotidiano, como casos de violência contra a mulher, maus-tratos de animais, danos morais e compliance – para prevenir fraudes e desvios de dinheiro –, são alguns dos assuntos abordados. Graduado em Direito pela Universidade Estácio de Sá, especialista pelo programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Penal e Processo Penal na mesma instituição, Xisto conversa com a REVISTA DOS CONDOMÍNIOS e traz informações e dicas importantes para os profissionais da gestão condominial.

“Existe uma mutação natural em todas as atividades desenvolvidas pelos humanos. E, com a escolha de síndico em condomínios residenciais, não ocorreu nada diferente. Antigamente, um bom síndico seria aquele cidadão que se prostrava como ordeiro, aplicava multa em quem violava a convenção e era temido por todos. Com o passar dos tempos, surgiu uma nova figura travestida de síndico e que ofertava flores no dia das mulheres, comprava brinquedo para as crianças e era visto como o gentleman perante a coletividade. A aceitação de tais comportamentos como regra foi perdendo espaço diante da necessidade de um modelo em que o condomínio fosse gerido de forma mais profissional e com as exigências das sociedades empresárias. E, a partir de então, um bom síndico, além dos deveres e das atribuições estipulados nas normas que regem a atividade, há de ser mediador de conflitos e buscar homogeneizar os comportamentos heterogêneos de uma coletividade aglomerada em um mesmo espaço”, antecipa nosso entrevistado.

Mas, posto esse desafio dos novos tempos, como o síndico pode desempenhar bem esse papel, reduzindo conflitos e zelando pelo bem-estar dos moradores de um condomínio? Xisto aponta que existem funções eletivas, como a de síndico, em que a razão primeira para o sucesso é a aceitação da coletividade que o escolhe. Em segundo lugar, é o respeito que deve dar e exigir de todos. E dai por diante; ser imparcial e tratar todos de forma igualitária. Assim sendo, agirá de forma hábil internamente com os condôminos, e deles ganhará o respeito para gerir os destinos da coletividade. O bem-estar dos moradores também está ligado ao fator de gestão patrimonial, com a oferta de serviços de qualidade, segurança do edifício e respeito às normas.

“O melhor caminho para que alguém seja bem-sucedido em qualquer atividade humana é a busca do conhecimento técnico. Às vezes, diante da dificuldade de escolha de um síndico orgânico dentre os moradores, e pela recusa dos mesmos em participar da gestão do condomínio, tem-se recorrido aos síndicos profissionais formados por instituições, dentre as várias que se colocam à disposição de quem pretende estudar e se formar síndico. Isso ocorre em razão de a função de síndico exigir dedicação e profissionalismo, pois pede conhecimento de diversas áreas, tais como contábeis, tributárias, administrativas, meio ambiente, maus-tratos a animais, compliance, violência doméstica, gestão de pessoal.”

Violência doméstica e maus-tratos contra animais

A violência doméstica e familiar contra a mulher está no pacote de preocupações dos gestores condominiais. “Era ditado popular que, em briga de marido e mulher, não se metia a colher. Ou seja, os vizinhos se omitiam diante de brigas e até de feminicídios ocorridos dentro da esfera condominial. Atualmente, essa prática foi relativizada, e qualquer condômino que presencie violência doméstica no âmbito familiar tem a obrigatoriedade de comunicar o fato às autoridades. Isso decorre em razão do estado de vulnerabilidade em que se encontram as vítimas da violência doméstica e em homenagem ao princípio da dignidade da pessoa humana, como núcleo rígido do constitucionalismo sobre o ordenamento jurídico, inclusive as normas condominiais expressas na convenção, no Código Civil e demais normas. No artigo 5º, inciso I, a Lei Maria da Penha prescreve que a definição de unidade doméstica é ‘um espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas.”

Outra triste demanda são os maus-tratos a animais. A princípio, é preciso frisar que os bichanos devem ser tratados como sujeito de direito e não como objeto. “Esse tema foi debatido na IX Jornada de Direito Civil da Justiça Federal. Tentou-se, na oportunidade, uma leitura constitucional do artigo 82 do Código Civil para inserir os animais. Porém, essa discussão ainda carece de um aprofundamento até chegar a uma aprovação. E os conflitos na seara condominial surgem desde o uso das áreas comuns, elevadores, uso de coleira, mau cheiro em corredores. Mas o que mais aguça o legislador é a questão que afeta aos maus-tratos. No RJ, foi publicada a Lei Municipal 7.053/2021, obrigando os condomínios residenciais e comerciais a comunicarem aos órgãos de segurança esses casos. Entendemos que a lei é inconstitucional, pois se trata de matéria de condomínio, ramo do Direito Civil, devendo ser de competência da União, e não do município”, disse.

Mas, de acordo com o entrevistado, isso é pouco relevante para os pets que sofrem os maus-tratos. O que deve prevalecer, de fato, é a máxima de que quem ama, cuida.”

Considerando-se que os condomínios costumavam ser geridos por pessoas sem conhecimento, na maioria das vezes moradores aposentados, era normal o estado de vulnerabilidade a que acabavam expostos. Nem sempre por má-fé, é bom que se diga, mas por incompetência para a gestão. “Mas a ausência de ética também permeia essa relação que viola os princípios da moralidade e da impessoalidade nos casos de privilégios e das más práticas com fornecedores que são capazes de colocar a instituição condomínio em risco perante a coletividade de moradores e a sociedade. Compliance é sinônimo de responsabilidade de todos os envolvidos e surge para incentivar a cultura da honestidade para com o patrimônio coletivo. E é bom que se diga: os condôminos respondem pela omissão se tiverem conhecimento de práticas imorais e não as fiscalizarem. Por isso é que a tecnologia surge como ferramenta para dar transparência aos atos da gestão com a disponibilidade de contratos firmados com fornecedores de produtos e serviços, das atas das assembleias, dos balancetes…”, pontua Xisto Mattos.

Qual o futuro da profissão?

E o que mais virá por aí? Qual o futuro da profissão e o maior desafio, nos dias atuais, neste cenário de crise generalizada? “Vislumbra-se que a profissão será muito promissora a quem a ela se dedicar, pois os desafios serão tentadores e exigirão profissionais capacitados para o exercício da função. Ainda existe um receio dos síndicos profissionais pelo simples fato de não ostentarem presença diária nas dependências do condomínio, mas isso é um sinal de que as coisas estão em frequente mutação. A cada dia os moradores perceberão que o mais importante não é ter alguém para tocar a campainha, e sim alguém que faça uma boa gestão, de modo que não seja preciso tocá-la. A crise generalizada exigirá um pouco mais dos gestores, que terão que ter capacidade de elaborar planos contingenciais e reduzir os custos das contribuições condominiais, sem perda da qualidade dos serviços. Assim, é visível que a necessidade de contar com um síndico profissional já é uma realidade”, conclui Xisto Mattos.

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